Foto: Divulgação / Rede Social
_Prefeito Antônio Milton de Abreu Passos
O Ministério Público Eleitoral, em sede de alegações finais, opinou pela procedência de Ação de Investigação Judicial Eleitoral (AIJE) para que seja cassado o mandato e tornado nulo os diplomas expedidos ao prefeito do município de Pau D’Arco Antônio Milton de Abreu Passos e seu vice, Antônio Lima Bacelar, declarando a nulidade dos votos que lhes foram atribuídos no pleito municipal do ano de 2024, determinando a realização de novas eleições no município, assim como seja declarada a inelegibilidade dos investigados para as eleições que se realizarem no período de oito anos.
A Coligação “COM A FORÇA DO POVO”, composta pelos partidos AVANTE, MDB e PRD, no município de Pau D’arco do Piauí, havia ajuizado a AIJE em desfavor também de Josenilton de Sousa Rodrigues Bacelar, ex-prefeito do aludido município.
Segundo os autores, houve contratação massiva e irregular de servidores públicos sob perspectiva e intuito eleitoreiro, utilização da estrutura administrativa para fins eleitorais e aumento injustificado de gastos públicos, sobretudo quanto a combustível.
Ao responder a ofício, o Tribunal de Contas do Estado (TCE-PI) apresentou informações reportando que “em 2024, o Município de Pau D’arco do Piauí possuía população estimada de 3.972 habitantes, segundo dados do IBGE disponíveis. Nesse cenário, o TCE/PI contabilizou que, somente em 2024, o Município chegou a dispor de 149 (cento e quarenta e nove) servidores efetivos, 80 (oitenta) comissionados e 85 (oitenta e cinco) contratados temporariamente, além de ter despendido pagamentos a pelo menos 150 (cento e cinquenta) funcionários terceirizados, com vínculo precário de relação de emprego”.
Neste contexto a acusação destacou que “noutras palavras, em um cenário onde o pleito eleitoral foi decidido por apenas 30 (trinta) votos, a influência do funcionalismo público e o potencial uso da estrutura administrativa para fins eleitoreiros, sobretudo na hipótese de contratações temporárias e precárias, merecem particular atenção, de modo que os fatos trazidos a conhecimento desta Justiça Eleitoral, além de pertinentes, afastam tese de inépcia da ação e petição inicial”, argumento apresentado pela defesa.
Ao passar à “análise pormenorizada das ilegalidades imputadas”, o órgão acusador destacou, entre outros, o seguinte:
- “A partir de análise das contratações celebradas pela Prefeitura Municipal de Pau D’arco do Piauí no ano de 2024, constata-se a flagrante precarização de vínculos empregatícios, seja pela nomeação de servidores comissionados ou contratação de temporários fora das excepcionalidades constitucionais, seja pela não demonstração de urgência ou necessidade que tanto sustentou a defesa dos investigados”.
- “Restou demonstrado que o Município, através do investigado Josenilton de Sousa Rodrigues Bacelar, não só contratou servidores por mera liberalidade, sem critérios mínimos e afastando-se do princípio basilar de impessoalidade, como desvirtuou a natureza das contratações, consignando servidores como “credores de serviços prestados”, em favor dos quais foram autorizadas notas de empenho e pagamento, como forma de burlar o limite de gasto com pessoal estipulado pela Lei de Responsabilidade Fiscal”.
- “Não bastasse isso, com vistas a contornar o período de vedação disposto na legislação eleitoral quanto à nomeação ou contratação de servidores, o então prefeito municipal lançou portarias durante os meses de julho e agosto de 2024, com supostos efeitos retroativos, a citar as nomeações de: Larissa Fernanda Silva Gomes de Sousa (Coordenadora da Saúde da Criança e Adolescente), Edilson Paulo da Silva (Assessor de Apoio Administrativo), Elenilton Martins dos Santos (Coordenador de Eventos de Lazer), Railia Gomes dos Santos (Assessor de Apoio Administrativo), Maria Tays Alves de Sousa (Assessor de Apoio Administrativo), cujas Portarias de Nomeação foram publicadas em datas muito posteriores ao suposto início dos vínculos junto à Administração pública. Esta replicada conduta, permite concluir não se tratar de mera irregularidade ou equívoco, mas conduta deliberada para burlar a legislação específica”.
- “Para além disso, a natureza dos cargos traduz a maneira estratégica como se mantiveram ou nomearam apoiadores políticos, Isso porque assumiram cargos de assessoramento – Assessor Especial; Assessor de Apoio Administrativo; Assessor de Apoio Externo - todos genéricos, além de cargos de confiança e de coordenadoria em alguns setores”.
- “A título de evidência, a peça vestibular trouxe diversos casos que apontavam para o cometimento de irregularidades na contratação ou promoção de servidores sem qualquer critério técnico, inferindo-se tratar de moeda de troca a apoio político. Em suas contestações, as defesas negaram as irregularidades, afirmando que todas as contratações foram pautadas pela necessidade de manter a continuidade dos serviços públicos essenciais, como saúde e educação”.
- “Nesse contraponto, insta nominar alguns servidores, inclusive citados durante a instrução processual: Barbara Daiana da Costa Ferreira, Chefe do Departamento Municipal de Meio Ambiente, foi amplamente vista em vídeos produzidos pela equipe de campanha eleitoral, reuniões, comícios, dentre outros eventos, em engajamento nitidamente superior à mera afinidade política, mas sim funcionando como “cabo eleitoral”. De igual modo, Vanuza Pinho do Nascimento, nomeada como “Assessora de Apoio Administrativo”, cujos materiais publicitários de campanha encartados aos autos atestam similar participação.”
CONTRATAÇÕES SUSPEITAS
Eraldo Reis Rodrigues de Lemos
“Mais gravemente, evidencia-se a contratação de Eraldo Reis Rodrigues de Lemos - Assessor de Apoio Administrativo, nomeado através de Portaria nº 124/2024. A defesa aduz que a nomeação se deu em 28 de junho de 2024, com efeitos a partir de 03/07/2024, portanto fora do período vedado. Ocorre que a publicação deste ato somente ocorreu em 02 de agosto de 2024, ao passo que não possuía assinatura eletrônica capaz de atestar a data na qual foi aposta. Ocorre que Eraldo Reis Rodrigues, pessoa conhecida do cenário político local, já exerceu mandato eletivo de vereador e, embora não reeleito, continuou a figurar como liderança política na região. As mídias acostadas aos autos atestam que o apoio político de Eraldo Reis foi motivo de comemoração e compartilhado abertamente nas mídias sociais, impulsionando a candidatura de Antônio Milton de Abreu Passos.
Para além disso, Francisco das Chagas Andrade, chefe de limpeza do Município de Pau D’arco do Piauí e vizinho próximo ao candidato eleito, quando ouvido em juízo, asseverou que rotineiramente presenciava Eraldo Reis Rodrigues ir à casa do candidato a prefeito, logo pela manhã, e, na sequência, sair para fazer visitas conhecidas como “Porta a porta”, inclusive com a entrega de material de campanha, sendo visto no veículo utilizado igualmente pelo candidato nestas ocasiões. Apesar dos esforços da defesa em descredibilizar os relatos apresentados por Francisco das Chagas Andrade, este demonstrou proximidade aos fatos, pois, além de residir próximo ao investigado, desempenhava suas atividades nas vias públicas, presenciando a concentração de apoiadores (“cabos eleitorais”) em praça pública rotineiramente durante o interstício eleitoral. Não é demais ressaltar que o reduzido perímetro da zona urbana de Pau D’arco do Piauí lhe possibilitaria efetivamente visualizar tais ações.
Em consonância, a testemunha Antônio da Costa Lemos, asseverou que o próprio Eraldo Reis Rodrigues lhe confidenciou estar empregado para tão somente receber o dinheiro, sem prestar serviços na prefeitura, mas que permaneceria “fazendo campanha” e somente a partir de janeiro (2025) passaria à “sala fria”, termo utilizado para um melhor emprego ou função.”
Elenilton Martins dos Santos
“O mesmo ocorreu em relação ao sr. Elenilton Martins dos Santos, nomeado para cargo de comissão de Coordenador de Eventos e Lazer, Portaria nº 103/2024-GP, igualmente publicada em agosto com efeitos retroativos a junho de 2024.
A testemunha Antônio da Costa Lemos foi categórica ao afirmar que via Elenilton Martins, conhecido como “Bolhão” ou “Boião”, praticando atos de campanha em horário típico de trabalho, ao passo que este era visto rotineiramente hastear bandeiras do candidato Antônio Milton de Abreu Passos. Quando não, em horários comuns de expediente na prefeitura, presenciou Elenilton Martins em casa, denotando a clara ausência de prestação de serviços.
Ao sentir ministerial, portanto, a contratação de Eraldo Reis Rodrigues, liderança política na região, bem como de Elenilton Martins dos Santos, para cargos comissionados desprovidos de quaisquer especificidade, formalizado artificialmente através de Portaria publicada durante período vedado, com supostos efeitos retroativos, sem demonstração mínima de serviços prestados na função pública que efetivamente estaria lotado, mas, pelo inverso, com provas contundentes que funcionaram como “cabos eleitorais” da campanha do sr. Antônio Milton De Abreu Passos às custas do erário público, denota clara utilização da máquina administrativa municipal e do abuso do poder político do então gestor municipal, sr. Josenilton de Sousa Rodrigues Bacelar”.
Larissa Fernanda da Silva Gomes de Sousa
“Menciona-se, ainda, a nomeação de Larissa Fernanda da Silva Gomes de Sousa – Coordenadora da Saúde da Criança e do Adolescente – através de Portaria nº 111/2024. O ato administrativo de nomeação foi publicado em iguais condições, com efeitos retroativos, cuja minuta aponta para data anterior. A defesa cita que iniciou na administração como menor aprendiz/estagiária, porém, ao completar maioridade (julho/2024), foi nomeada para o aludido cargo de Coordenação. A defesa não explicou qual o impeditivo legal da continuidade como estagiária, ao passo que sua promoção para cargo de coordenação se mostrou desproporcional.”
José Itamar de Sousa Barros e Antônio Luiz Silva Araújo
“Quanto aos demais vínculos, os investigados somente conseguiram conferir contexto plausível para a contratação de José Itamar de Sousa Barros e Antônio Luiz Silva Araújo, os quais seriam contratados excepcionalmente para o cargo de motorista, durante reforma estrutural do prédio sede da Unidade Escolar “César Leal”. O Ex-Secretário de Educação, sr. Pedro Alves da Silva, destacou que em razão do remanejamento de alunos, as rotas do transporte escolar foram afetadas, passando-se a utilizar um ônibus da reserva e necessitando contratar excepcional de um motorista.
Ponto nebuloso, porém, persistiu quanto à nítida incongruência temporal entre esta particularidade e necessidade dos serviços (março de 2024) e o primeiro pagamento despendido em favor de José Itamar de Sousa Barros e Antônio Luiz Silva Araújo, dado em agosto de 2024, os quais foram igualmente consignados como prestadores de serviços avulsos, em nítida precariedade da relação empregatícia.”
"FATO INCONTESTE"
Para o Ministério Público Eleitoral há “fato inconteste, portanto, que a municipalidade, através de seu gestor municipal, contratou, de forma irregular e ilícita, dezenas de servidores inclusive durante período eleitoral vedado”, sustentando que “a extensão dessa ilicitude culminou em incremento desproporcional de funcionários ao quadro de servidores, bem como à elevação dos gastos públicos de forma demasiada.”
Argumentou ainda que “para o mesmo período, mês de agosto, Pau D’arco do Piauí contava com cerca de 48 servidores temporários em 2023, número que saltou para 88 em 2024. O número de contratados mediante prestação avulsa de serviços em 2023, cerca de 119 passou para quantitativo superior a 150 em 2024, observando-se, ainda, irregularidade no pagamento de terceiros por intermédio de uma pessoa física apenas (Jurandir Alvino de Sousa Abreu), tudo consoante dados fornecidos pelo Tribunal de Contas do Estado”.
“O desvirtuamento das contratações para o viés eleitoral é igualmente visível em relação aos cargos de vigia e recepcionista. O teste seletivo deflagrado pela municipalidade em 2023 e ora aproveitado/prorrogado em 2024 sequer previu vagas para estas funções, porém, durante o ano eleitoral, sobretudo a partir de julho de 2024, foram contratados 10 (dez) novos vigias e, pelo menos 07 (sete) recepcionistas”, pontuou o órgão acusador.
POPULAÇÃO COMO COMPARATIVO
A defesa dos investigados sustenta que inexistiu contratação massiva de servidores, uma vez que quando analisados friamente as contratações em números absolutos, não estaria demonstrada a desproporcionalidade apontada.
O MPE vê a situação de forma diferente.
“Ocorre que como dito anteriormente, o caso em apreço se reveste de particular condição, sobretudo pela diminuta população local e a influência do funcionalismo público nas famílias paudarcopiauienses”, argumenta.
Destacou ainda que “em agosto de 2023, o funcionalismo público de Pau D’arco do Piauí contava com 123 servidores efetivos, 76 comissionados e 48 temporários. No mesmo período, em 2024, quando já dispunha de 143 efetivos, portanto 20 (vinte) a mais, elevou para 80 comissionados e ampliou os contratos temporários para 88 vínculos, perfazendo acréscimo de 64 funcionários públicos. Repisa-se, que em paralelo, o Município igualmente exacerbou a contratação de “prestadores de serviço” para desempenho de funções essenciais, em nítida dissimulação. Logo não há que se falar em normalidade das contratações”.
CONTRATADOS MANIFESTARAM APOIO AO CANDIDATO
No entender do Ministério Público Eleitoral, “dezenas de contratações foram realizadas sem qualquer processo seletivo público, sem critérios objetivos e transparentes. Ao revés, valeu-se de critérios escusos e subjetivos, admitindo pessoas que, no mínimo em sua maioria esmagadora, manifestaram preferência pelo futuro candidato apoiado pelo governo municipal”, sendo que “tal circunstância, merece a atenção não somente dos órgãos que atuam no controle dos atos da Administração Pública, como o Tribunal de Contas, mas também da Justiça Eleitoral, especialmente por serem incrementadas exponencialmente em ano de eleição”.
PARTICIPAÇÃO EM ATOS DE CAMPANHA
O órgão acusador afirma ainda que “é possível observar de modo mais nítido a correlação de tais práticas com o abuso de poder eleitoral, na medida em que os servidores contratados no período em questão participaram, em sua grande parte, de atos de campanha em prol dos candidatos ANTONIO MILTON DE ABREU PASSOS E ANTONIO LIMA BACELAR, seja por meio do já conhecido “porta a porta”, seja declarando seu apoio publicamente por meio de redes sociais, participando ativamente do marketing político, etc”.
“Nota-se que a quase totalidade desses funcionários possui vínculo precário, com grande parte tendo sido contratada justamente entre os meses de fevereiro e agosto de 2024. (...). Percebe-se, então, da análise conjunta dos autos, que a máquina estatal foi movimentada de modo ostensivo para favorecer grupo político específico. Nesse cenário, pouco importa se os beneficiados pelos atos tenham praticado eles próprios as condutas abusivas (atos administrativo)”, complementa.
“A compreensão ministerial é da clara correlação entre os atos administrativos ilegais perpetrados e o resultado das eleições municipais de 2024 no município de Pau D’arco do Piauí, pois a análise conjunta identifica o abuso de poder eleitoral praticado pelos representados e a nítida implicação e influência destes atos no resultado do pleito majoritário. O grande número de contratados (apoiadores do então candidato Antônio Milton de Abreu Passos e seu vice) se travestia, na verdade, em força de campanha a cargo de determinado grupo político que participava do pleito eleitoral, prática que infelizmente tem ocorrido com certa frequência nas eleições do país”, pontua.
fonte 180graus.com