Impunidade transforma Teresina na capital da exploração sexual de crianças e adolescentes
Padres, empresários, políticos e até fundadores de Ong’s figuram como aliciadores e pedófilos
Depois de receber um pedido de socorro, de um homem que há 27 anos é educador de rua, a reportagem do Portal AZ decidiu seguir os passos dele e traçar o mapa da pedofilia e aliciamento de meninas e meninos em Teresina.
Padres, empresários, políticos e até fundadores de Ong’s (para tirar menores de rua) figuram como aliciadores e pedófilos. O trabalho foi feito durante dois meses por jornalistas e educadores de rua na capital.
O “esquema” do aliciamento quase nunca chega ao conhecimento da polícia. Os agenciadores já tem o perfil da vítima, jovens da periferia que vivem em situação de risco.
O aliciador leva o escolhido para um banho de loja, geralmente em shoppings. Impressionados com os presentes meninos e meninas com aproximadamente 12 anos, idade em que a criança não possui discernimento de entender o que se passa, são apresentados aos algozes.
Pedofilia
Conhecido e respeitado na Igreja Católica um padre, com mais de quatro décadas de atuação, é o que pode se chamar de “decano” na pedofilia. Ele é acusado de abusar sexualmente de meninos de até 12 anos de idade e de levar as crianças para uma casa abandonada que ele mantém a 47 quilômetros de Teresina, na localidade Canaã, município de Caxias, no Maranhão.
O nome dele todos sabem, inclusive seus superiores hierárquicos, mas no entanto, insistem em desconhecer suas atividades. Procurado, o arcebispo de Teresina, Dom Jacinto Brito, disse que não falaria da pedofilia do padre por telefone. Mas nem pessoalmente, o repórter do Portal AZ é bem recebido na arquidiocese.
A pedofilia estaria sendo praticada há cerca de 30 anos pelo padre, que diz “aos quatro cantos”, ser responsável por recuperação de crianças e adolescentes em situação de risco.
Hoje com 23 anos de idade, o encanador J.P.S.N., relata casos bizarros vividos entre ele, o padre e amigos. “Eu morava no bairro Primavera. O padre me encontrou e disse que iria cuidar de mim. Me deu roupas, calçados, comida e me levou para a casa dele. Lá já tinham outros meninos. Na época, eu tinha 13 anos de idade. Todos que moravam na casa faziam sexo com o padre. Para todos os lugares que ele ia, nos levava”, relata J.
A reportagem do Portal AZ foi até a localidade Canaã. Lá, entrevistou vizinhos da casa construída e visitada pelo padre. “Ele sempre vem ai com meninos. Alguns deles parecem ter cerca de 12 anos de idade. Um rapaz matou o outro ai (na casa), jogou dentro do poço. Depois disso, o padre passou um tempo sem andar, mas já voltou a andar por aqui novamente”, relata uma vizinha da casa, dizendo que não é segredo e que não é de hoje que o vigário mantém a casa abandonada para abusar sexualmente dos meninos. “O senhor pode perguntar para qualquer pessoa aqui da região que ela lhe conta a mesma história”, disse.
E assim a reportagem fez. Sete famílias diferentes foram ouvidas. Todas sabem do que chamam de “safadeza” do padre. O morador da localidade R.A.L, 48 anos, proibiu até o filho de sair de casa quando padre está na comunidade.
Como a casa do padre estava abandonada e sem portas, nem janelas, a reportagem entrou no local. No interior não existe nenhum móvel. “Eles trazem redes, comida, água e ficam ai. De longe todo mundo vê os agarra-agarra. Essa casa é só para fazerem o que não presta lá dentro”, reclama a vizinha.
Recursos públicos
O “negócio” da pedofilia movimenta até recursos públicos em Teresina. Outro decano no crime tem uma ONG que supostamente tira meninos (homens) das ruas. Recebe dinheiro dos cofres públicos para o “negócio”, mas a pratica conhecida mesmo é a pedofilia que o responsável pela ONG estaria praticando há mais de 20 anos, sob o manto do protecionismo político e omissão das autoridades policiais.
Mas não é só o padre e o dono do ONG que se perpetuam no crime. O raio X da exploração sexual aponta também um empresário, dono de posto de gasolina em Teresina e em algumas cidades do interior. Seriam 13, ao todo, além de empresas do ramo da construção civil, comercio varejista, clubes sociais.
Esse empresário é muito citado como sendo explorador sexual de adolescentes (meninas) na periferia de Teresina. Usa o poder econômico para seduzir jovens carentes.
Medo
O educador de rua que acompanhou todos os passos da reportagem do Portal AZ no mapa da exploração sexual e pedofilia, não quis mostrar a cara. “Eles são muito poderosos, mas a verdade é que Teresina é a capital do aliciamento de menores, da pedofilia e da hipocrisia”, disse, com os olhos cheios de lágrimas.
Os casos não são levados à polícia devido a ameaças (até de morte), o poder econômico dos pedófilos e aliciadores e a lenda de que “isso não vai dá em nada”.
“E é exatamente a impunidade que faz com que essa prática criminosa aumente a cada dia na periferia. É como se fosse uma coisa normal, que salta aos olhos de todos, sem nenhuma providência por quem de direito”, desabafa o educador de rua.
As vítimas são aliciadas, em sua maioria, na periferia. Não são alcançadas pelas políticas públicas. Muitas delas são vítimas ainda na infância, a partir dos 11 anos de idade.
Posição da Igreja
O arcebispo de Teresina, Dom Jacinto Brito, disse que não falaria da pedofilia do padre por telefone, quando atendeu a uma ligação feita pela redação do Portal AZ, inicialmente para saber detalhes de sua visita a João Pessoa (PB), na qualidade de enviado do Vaticano para apurar denúncias do suposto envolvimento do arcebispo da Paraíba, Dom Aldo Pagotto, com exploração sexual.
A reportagem foi pessoalmente a Arquidiocese, na manhã dessa quinta-feira (07/07), mas não foi recebida. Ao saber do assunto a assessoria ficou com o número do telefone do jornalista para retornar. Não o fez até a publicação desta matéria.
O dono da ONG, apontado igualmente como aliciador de menores, também não recebeu a reportagem, mas mandou dizer que tem que ser respeitado, pois trabalha há mais de 20 anos “tirando menores das ruas”.
*As pessoas ouvidas na matéria pediram para não ter seus nomes revelados devido a gravidade das denuncias, mas todas as conversas foram gravadas e serão encaminhadas para as autoridades competentes.