A falta de incentivo ao esporte é um dos principais impasses na construção da carreira de um atleta brasileiro devido às dificuldades que enfrentam, principalmente no quesito financeiro, com a necessidade de deslocamento para participação em competições, e os altos custos das viagens para fora do estado de origem dos atletas. Nem sempre só a força de vontade é capaz de formar vencedores e, na maioria das vezes, a falta de apoio é um dos principais entraves para a conquista do podium.
Mesmo tendo um papel social muito importante, com o poder de afastar os jovens das ruas, do crime, e o envolvimento com as drogas, o esporte ainda enfrenta barreiras para chegar até a população periférica.
O jovem Kadel Emanuel, de 12 anos, é um exemplo de como não basta ter apenas força de vontade, a falta de incentivo por parte do poder público, e a dificuldade financeira podem ser um empecilho para seguir no esporte. Residente na zona sul de Teresina, no bairro Angelim, e chegou à natação após ser diagnosticado na infância com hiperatividade. Os pais do adolescente foram recomendados pelo médico a procurarem uma atividade física que o ajudasse no desempenho e foco.
Mas apesar dos desafios, Kadel já coleciona várias medalhas e é uma das apostas da natação piauiense. Sua última vitória foi nas competição dos jogos escolares do Piauí, conquistando medalhas de prata e bronze no primeiro dia de competição e no segundo dia, ficou com o bronze. Nesta seletiva, Kadel ficou entre os seis classificados para participar da competição de natação em São Paulo.
A família esteve na sede do Portal, que patrocinou o atleta em algumas competições, e revelou em entrevista os desafios enfrentados para manter o jovem promissor da natação piauiense no esporte, e permitir que participe de mais competições no país.
A mãe, Maria das Graças contou que, de início, tentou inserir o filho no futebol e na natação, mas Kadel encontrou o seu lugar no nado.
“Quando ele tinha 6 anos foi diagnosticado com uma hiperatividade leve, o médico pediu para que o colocasse em algum esporte que gastasse energia. A gente colocou na natação e futebol, mas ele se encontrou mais na natação, gosta do futebol, mas se encontrou mais na natação”, iniciou.
A mãe conta que o papel dos professores foi determinante para despertar o interesse do garoto, pois, sua inserção na modalidade foi um pouco difícil. Depois de um tempo de prática, um professor de natação viu Kadel treinando no Clube dos 100, onde ele pratica o esporte, e o convidou para competir. Desde então, o que era para ser uma atividade recreativa e voltada à saúde do jovem, se tornou uma profissão.
“Na realidade, a gente não chegou a ver o quanto ele estava interessado porque ele tinha medo. A primeira professora dele teve que empurrar ele dentro da piscina, ele tinha medo, a gente colocou mais por questão de saúde, esse professor, o professor Henrique abriu nossos olhos e mostrou que ele tinha capacidade de competir. Ele veio um dia aqui e gostou do Kadel, pediu para que a gente o deixasse competir, isso há dois anos atrás, temos dois anos que competimos, quatro anos de natação. Aí gostaram, ele viajou, ganhou a primeira medalha, e continuou na natação como profissional, mas, antes, era só por saúde”.
Ao relembrar a primeira competição do filho, a mãe diz que ele não demonstrou nervosismo, contudo, não tinha noção do peso da competição. Somente com o tempo, Kadel foi se aperfeiçoando e entendendo como tudo funcionava na prática.
“A primeira ele não estava muito nervoso. Ele achava que era só chegar à frente e já era o campeão. Ele não sabia que tinha de competir por série. Tanto que, na primeira competição ele chegou em terceiro lugar na série, mas na idade dele, ele ficou em 5º, aí não chegou a pegar medalha, foi quando ele se aperfeiçoou, pois, ele percebeu que tinha que competir com mais pessoas”
Nem tudo são flores, há pedras no caminho
Com a ascensão de Kadel no esporte, surgiram vários convites e campeonatos a serem disputados, porém, os pais começaram a ter dificuldades para custear a ida do jovem às competições por causa dos gastos financeiros que são demandados como: trajes, alimentação, hospedagem e locomoção.
Kadel ainda não tem um agente patrocinador, por meio de rifas e sorteios, os pais arrecadam dinheiro para prover os recursos necessários para a carreira do garoto. A mãe relata que, depois de fazer essas ações, chegou a ouvir críticas afirmando que eles não precisavam promover essas campanhas porque o custo do esporte é alto e isso demonstrava que a família tinha uma certa condição.
“É muita dificuldade financeira, a gente até chegou a ouvir certas críticas porque diziam que tínhamos uma condição melhor porque a natação é um esporte muito caro. Desde o traje, ao pé de pato que ele usa, todos os materiais que ele usa são caríssimos. Então, a maior dificuldade é a questão financeira porque do estado não temos ajuda de nada, tudo é os patrocínios que a gente corre atrás para ajudar ou a gente faz rifas, bingos, a gente se mantém assim”, relatou.
Outro fator complicado, segundo a família, é a falta de reconhecimento. Kadel foi o único a conseguir alcançar o 6º lugar nos Jogos Escolares Piauienses (JEPs), sendo classificado por escola pública, porém, não houve nenhum um tipo de reconhecimento pelo feito do atleta.
“A falta de reconhecimento é tanta. Na faixa etária da idade dele, de 12 a 14 anos, ele foi o único aluno de escola pública que passou em 6º lugar e a escola não sabia. há uns dois meses atrás um aluno de 12 anos foi assassinado no Parque Vitória, envolvido com drogas e facções e eles repostaram o caso no Instagram, eu postei que o Kadel foi o sexto colocado e não repostaram isso. É como se dessem mais importância a violência na periferia”, ponderou.
O esporte como transformador social
Ainda ao Portal R10, a família relatou como a natação tem ajudado na manutenção do bem-estar social de Kadel. Maria, que é mãe de dois filhos, relata que todos em casa trabalham e se revezam para cuidar do atleta.
“A natação ajuda o Kadel a sair das ruas porque como eu, o pai e a irmã, de 22 anos, trabalhamos, ele iria ficar em casa praticamente só, ao invés de ele estar na rua brincando ou até usando algo que não devia, ele está no treino”.
Para Kadel Emanuel, depois que começou a praticar natação, sua vida mudou totalmente. Ele afirma que o desporte tem o distanciado de pensamentos negativos, além de ajudar a ter mais foco nas atividades fora dos treinos.
“Ela tem me ajudado a conseguir realizar meus sonhos, que era viajar para outros lugares por algum esporte, sempre quis ganhar medalhas, ela tem me ajudado a esquecer coisas negativas quando eu estou mal. Eu treino foco, e ela sempre me ajuda”.
Até o fim de 2023, o jovem tem cerca de 4 campeonatos para disputar. A família relata que tem sido difícil financiar a ida em todos os eventos, pois, o tempo para “correr” atrás de subsídios é curto e o custos são muitos altos.
“O próximo agora é dia 30, tem águas abertas na Lagoa do Portinho, em Parnaíba, setembro a gente tem Fortaleza, outubro a gente tem São Luís, e em dezembro, Maceió. A gente paga uma, já pensando na outra. A mais cara é Maceió por conta da distância”, diz.
Recentemente, a mãe chegou a inscrever o filho no programa "Bolsa Atleta", da Prefeitura Municipal de Teresina (PMT), mas Kadel não foi selecionado para o programa devido ao baixo número de vagas.
fonte www.portalr10.com