quarta-feira, 13 de setembro de 2023

Entenda o passo a passo e como foi decidido o processo que cassou o prefeito Joãozinho Félix

 FOTO: REPRODUÇÃO

Entenda o passo a passo e como foi decidido o processo que cassou o prefeito Joãozinho Félix
_Joãozinho Félix

O ‘polêmico’ processo que culminou em julgado da  3ª Câmara de Direito Público, do Tribunal de Justiça do Piauí (TJ-PI), tendo como um dos efeitos a cassação do mandato do prefeito de Campo Maior, João Félix de Andrade Filho, o Joãzinho Félix, teve a seguinte ordem cronológica no trâmite processual, oriundo da primeira instância, até onde se encontra no patamar atual, segundo os autos, em levantamento feito pelo Blog Bastidores, do 180graus.com.

RESUMO DAS OCORRÊNCIAS

1 - O processo diz respeito a uma Ação de Reparação de Danos Morais e Materiais combinado com Improbidade Administrativa ajuizada pelo Município de Campo Maior-PI contra João Félix de Andrade Filho sustentando que o ora réu, em seu último ano de mandato (anterior a este), assinou diversos acordos extrajudiciais com prestadores de serviço reconhecendo dívidas que somam o valor de R$ 180.788,10, sem que fossem observadas as condições previstas nos artigos 15 e 16 da Lei de Responsabilidade Fiscal, inviabilizando, assim, a programação financeira da gestão posterior, motivo pelo qual, requereu o reconhecimento dos atos de improbidade administrativa do réu fundamentados nos artigos 9º e 10 da Lei de Improbidade Administrativa (LIA), bem como a sua condenação nas penas previstas no artigo 12, II e III da LIA. 

2 - Na sentença, o Juízo de primeira instância julgou procedentes os pedidos formulados na petição inicial, condenando Joãozinho Félix à suspensão de seus direitos políticos por 5 longos anos, ainda ao pagamento de multa civil no valor de 20 vezes a remuneração que recebia à época como prefeito de Campo Maior, além de que, à proibição de contratar com o Poder Público e receber benefícios e incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica do qual seja sócio majoritário, pelo prazo de 3 anos, condenando-lhe, ainda, ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, estes no percentual de 10% sobre o valor da condenação.

3 - Prolatada a sentença, foram opostos Embargos de Declaração pelo réu, os quais, foram conhecidos, porém, improvidos. Os embargos servem para suprir omissões, obscuridades ou contradições do julgamento, tornando-as mais claras.

4 - A defesa de João Félix ingressa com a apelação, tendo por objetivo modificar a sentença. 

5 - Em sede de juízo de admissibilidade recursal, o recurso fora conhecido e recebido em seu duplo efeito legal pelo então relator, desembargador Ricardo Gentil Eulálio Dantas.

6 - Em 21 de julho de 2020, o município de Campo Maior apresenta petição de Chamamento do Feito à Ordem, sob o argumento de que o recurso de apelação foi equivocadamente recebido, apesar de intempestivo (muito fora do prazo previsto em lei para seu ingresso), tendo em vista que a sentença dos embargos foi publicada no dia 19/07/2018, assim, a data final para interpor a Apelação Cível seria quinta-feira dia 09/08/2018, e não 24/08/2018, por isso intempestiva. Aqui, para o MP-PI, transitou em julgado. Advogados dormiram no ponto e o processo findou-se.

7 - Em 2020 Joãozinho Félix é eleito prefeito de Campo Maior, assume em 2021, com mandato até o fim de 2024. Lembrando que devido à pandemia de Covid-19, as eleições foram realizadas em 15 de novembro de 2020.

8 - Antes de tomar posse, porém, e até antes de ser eleito nas urnas, na data de 11 de setembro de 2020, o então relator do recurso [o então relator seria o desembargador Ricardo Gentil Eulálio] prolatou decisão declarando-se suspeito, por motivo de foro íntimo, em razão de fato superveniente, para atuar no presente feito, e o fez com base no artigo 145, § 1º, do Código de Processo Civil, também segundo os autos. 

9 - Os autos foram então redistribuídos para o desembargador Olímpio José Passos Galvão que, na data de 19 de novembro de 2020, proferiu despacho determinando o retorno dos autos em diligência para o Juízo de origem (o juízo de primeiro grau), a fim de que a Secretaria da Vara certificasse se o recurso de apelação foi protocolado dentro do prazo legal, devendo, em caso positivo, ratificar a certidão. E, por outro lado, em caso negativo, retificar a sobredita certidão, procedendo com a remessa dos autos ao Tribunal de Justiça tão logo fosse atendida a referida diligência. 

10 - CORRIGINDO O SUPOSTO ERRO: É então juntada a certidão de retificação (ou seja uma certidão corrigida) da tempestividade (que no primeiro momento atestou tempo oportuno, dentro do prazo) do apelo. A apelação, na verdade, havia sido protocolada de forma intempestiva, fora do prazo, portanto, como constatou o Blog Bastidores, do 180graus.com, ao realizar o levantamento com base nos autos. A certidão foi para o TJ nos seguintes termos:

FOTO: REPRODUÇÃO DOS AUTOS_A perda de prazo atestada pela Justiça estadual
_RETIFICAÇÃO: A perda de prazo atestada pela Justiça estadual

11 - Daí então foi prolatada decisão terminativa de não conhecimento da Apelação Cível em virtude de sua flagrante intempestividade. Ou seja, subiu recurso para o TJ-PI com ateste de tempestivo, dentro do prazo, e depois, viu-se que ele estava fora do prazo segundo o documento acima. 

12 - A defesa de Félix ingressa com Embargos de Declaração em decorrência dessa última decisão de não reconhecimento da tempestividade. Os embargos foram conhecidos e improvidos. 

13 - Não satisfeito, a defesa do político ingressou com um Agravo Interno, que acabou sendo julgado na sessão ordinária do plenário virtual realizada no período de 11 a 18 de fevereiro de 2022, tendo os componentes da 3ª Câmara de Direito Público, à unanimidade, negado provimento ao recurso mantendo-se em sua integralidade a decisão agravada que não conheceu do recurso de apelação em razão de sua evidente intempestividade, porque fora do prazo a interposição dele.

14 - Em face do acórdão é interposto novamente Embargos de Declaração pela defesa de Félix, o Joãozinho. 

15 - Pois bem, após o processo ter sido incluído na pauta de julgamentos do Plenário Virtual, o embargante João Félix de Andrade Filho peticionou nos autos alegando questão de ordem pública motivada pelas alterações implementadas pela nova Lei de Improbidade Administrativa, a Lei nº. 14.230/2021. Dentre as modificações estava a revogação do artigo 11, inciso I, da antiga Lei de Improbidade Administrativa (Lei nº. 8.429/1992), cujos efeitos mais benéficos devem ser aplicados em seu favor na forma da tese fixada pelo STF, sob a sistemática da repercussão geral, no julgamento do ARE nº 843.989, fato este que motivou a retirada do processo de pauta julgamentos por determinação do então relator (que aqui seria o desembargador Olímpio José Passos Galvão).

16 - Intimado para se manifestar acerca da referida questão de ordem, o Ministério Público Superior opinou por sua rejeição.

17 - Na Sessão Ordinária do Plenário Virtual realizada no período de 24 de outubro a 3 de novembro de 2022, o julgamento do recurso fora suspenso em razão do pedido de destaque realizado pelo então desembargador Raimundo Nonato da Costa Alencar.

18 - O julgamento acabou por se desenvolver da seguinte forma, o desembargador relator proferiu voto no sentido de: “CONHECER do recurso de Embargos de Declaração, para acolher a questão de ordem suscitada pelo embargante (Joãozinho Félix), reformando a decisão monocrática que inadmitiu a apelação, bem como a sentença do juízo de primeira instância, a fim de julgar totalmente improcedentes os pedidos iniciais, afastando-se, por consequência, a condenação imposta ao embargante de perda dos direitos políticos pelo prazo de 5 anos, de imposição das sanções correspondentes ao pagamento de multa civil e de proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente”.

O juiz Dioclécio Sousa da Silva (magistrado em substituição no 2º grau) inaugurou divergência no sentido de conhecer os Embargos de Declaração e, no mérito, negar-lhes provimento, bem como julgar improcedentes os pedidos reivindicados na questão de ordem suscitada pelo recorrente, mantendo a decisão embargada em todos os seus termos. Após, determinou que fosse certificado o trânsito em julgado dos autos, nos termos do art. 1.006, do CPC/2015 e encaminhado o feito ao Juízo de origem para o imediato cumprimento de sentença contra Joãozinho Félix.

O então desembargador Raimundo Nonato da Costa Alencar acompanhou o voto do relator. Em razão da não unanimidade ocorreu a ampliação de quórum, razão pela qual, o processo fora retirado de pauta para prosseguimento de julgamento na primeira sessão disponível por videoconferência.

19 - Na sessão ordinária, por videoconferência, da 3ª Câmara de Direito Público, do TJ-PI, realizada em 17 de novembro de 2022, o então desembargador Raimundo Nonato da Costa Alencar proferiu questão de ordem quanto à desnecessidade de ampliação de quórum no processo em questão, tendo sido acolhida pelo desembargador relator. Concedida a palavra à representante do Ministério Público Superior, assim como, ao patrono da parte embargante, ambos manifestaram-se no sentido de acompanhar a questão de ordem quanto à desnecessidade de ampliação de quórum. O juiz de direito Dioclécio Sousa da Silva não concordou com a questão de ordem e foi voto vencido. Deste modo, superada e acolhida a questão de ordem suscitada pelo então desembargador Raimundo Nonato da Costa Alencar, por maioria de votos, prosseguiu-se ao julgamento, que deu-se no sentido de: “CONHECER do recurso de Embargos de Declaração, para acolher a questão de ordem suscitada pelo embargante, reformando a decisão monocrática que inadmitiu a apelação, bem como a sentença do juízo de primeira instância, a fim de julgar totalmente improcedentes os pedidos iniciais, afastando-se, por consequência, a condenação imposta ao embargante (Joãozinho Félix) de perda dos direitos políticos pelo prazo de 5 (cinco) anos, de imposição das sanções correspondentes ao pagamento de multa civil e de proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente”.

O juiz de direito convocado Dioclécio Sousa da Silva manteve seu voto divergente.

20 - O Ministério Público ingressa com Embargos de Declaração. Ainda segundo os autos, constata-se que o órgão colegiado, a 3ª Câmara de Direito Público do TJ, por maioria de votos, acolheu a questão de ordem de Joãozinho Félix, aplicando, “equivocadamente”, os efeitos benéficos da nova lei de improbidade administrativa em seu favor, ao argumento que se sucedeu a revogação expressa do ato ímprobo que lhe fora imputado e de ausência do trânsito em julgado da condenação a ele imposta e, em consequência, reformou tanto a decisão terminativa que não conheceu da Apelação Cível, porque interposta fora do prazo, como a sentença prolatada pelo magistrado do primeiro grau, a fim de julgar totalmente improcedentes os pedidos de sanções contra o político.

21 - A 3ª Câmara de Direito Público do TJ entende que o acórdão embargado não apreciou questão já levantada, discutida e reconhecida pela Câmara, bem como assentada nos autos pela certidão que atestou a intempestividade do recurso de apelaçãoEm sendo assim, a intempestividade da Apelação Cível, insuperável, não foi objeto de análise do acórdão embargado, havendo omissão a ser suprida, sob pena de restar incompleta a prestação jurisdicional,segundo consta dos autos em levantamento do Blog Bastidores, do 180graus.com.

O entendimento da Câmara segue no sentido de que conforme certificado nos autos, a sentença proferida pelo magistrado do primeiro grau foi movimentada no sistema THEMIS em 17/07/2018 e disponibilizado(a) no Diário nº 8477, página 176, na Quarta-feira, 18 de Julho de 2018, computando-se a publicação na Quinta-feira, 19 de Julho de 2018, tendo a defesa do réu apresentado RECURSO DE APELAÇÃO conforme Petição Eletrônico. Nº 0001970-91.2014.8.18.0026.5001, em data de 24/08/2018 – 12:02. Portanto fora do prazo estipulado no artigo Art. 1.003, § 5º, do Código de Processo Civil, sendo o recurso intempestivo. 

Isso porque o prazo previsto para o ex-gestor municipal recorrer não é contado em dobro, vez que a condenação foi imposta à pessoa do gestor e não ao ente público.

O juízo de admissibilidade propõe-se a verificar se será possível o exame do conteúdo da postulação e, por isso, tem precedência lógica sobre o juízo de mérito, nos termos do artigo 1.011, inciso I, do Código de Processo Civil.

Assim, a análise do mérito do recurso somente há de se desenvolver de modo pleno se concorrerem os requisitos indispensáveis à superação do juízo de admissibilidade. Se o juízo de admissibilidade for positivo, passa-se ao exame do mérito; do contrário, não se conhece do recurso, o que impede a análise de seu conteúdo, mesmo que se trate de matéria de ordem pública.

Desta forma, uma vez que não ultrapassado o juízo de inadmissibilidade recursal, é defeso (proibido, não permitido) o julgamento do mérito da causa.

E, sendo a tempestividade requisito de admissibilidade recursal, detém o caráter de matéria de ordem pública, podendo haver atuação de ofício em qualquer tempo ou grau de jurisdição, razão pela qual, não se sujeita a preclusão.

Em face disso, não havia como como acolher a questão de ordem levantada por João Félix, que tentou se beneficiar das mudanças na lei de improbidade administrativa“porquanto, trata-se de matéria afeta ao mérito da causa e, no caso, o recurso de apelação não fora conhecido ante sua notória intempestividade, de forma que recurso intempestivo é incapaz de devolver ao Tribunal a apreciação da matéria impugnada”.

“Ressalte-se, por fim, que a intempestividade recursal gera o trânsito em julgado da sentença”, foi o entendimento.

22 - O RESULTADO: “ (...) Após, determinar que seja certificado o trânsito em julgado da sentença, ocorrido no dia seguinte após expirado o prazo para interposição do recurso extemporâneo, nos termos do artigo 1.006, do Código de Processo Civil, dando-se baixa na distribuição do 2º Grau, bem como procedendo-se a remessa dos autos ao Juízo de Direito da 2ª Vara da Comarca de Campo Maior-PI, para os fins cabíveis à espécie, no que concerne ao cumprimento imediato da sentença”.

QUEM PARTICIPOU DESSA PARTE FINAL DO CASO

Participaram do julgamento dos Embargos de Declaração do MP-PI o desembargador Fernando Lopes e Silva Neto, desembargador Agrimar Rodrigues de Araújo e a magistrada Haydeé Lima de Castelo Branco (Juíza designada). 

Impedimento/Suspeição: Desembargador Ricardo Gentil Eulálio Dantas. 

Procuradora de Justiça Catarina Gadelha Malta de Moura Rufino

"O PROCESSO NÃO ACABOU", DIZ ADVOGADO

O advogado do Grupo Eugênio e diretor de conteúdo do Brjus disse que "o julgado não acabou". 

"Ainda cabem diversos recursos. Inclusive desse acórdão para o STJ  e STF (dependendo da estratégia que a defesa for adotar). Mas nenhum com efeito suspensivo", disse.

"Ou seja, quando a decisão descer para o juízo de primeiro grau, cabe a ele enviar o acórdão para a Câmara de Vereadores, que deverá retirar o prefeito do cargo e em ato continuo empossar o vice", pontuou.

fonte 180graus.com