Ao decidir pela absolvição do defensor público acusado de ser propineiro, Adriano Moreti, numa avaliação em que não há a distinção do que é a quebra de um sigilo telefônico e do que é uma escuta telefônica, assinada pelo governador do estado Wellington Dias (PT), há, na verdade, nas entrelinhas, a produção de um libelo em prol da elevação do ego do acusado.
Uma das testemunhas em favor de Moreti é Dayana Sampaio Mendes, que relata que o defensor público, “quando ocupou a Comarca de Pedro II nunca ouviu falar de cobrança de propina pelo Dr. Adriano Moreti, somente ouviu falar muito bem dele; que ele era um defensor competente e inclusive recebeu o Título de Cidadão Pedro Segundense, pelos préstimos na comarca”. Como se atos corruptos se dessem às claras, à luz do dia ou à vista de todos.
Ora, tais títulos, na maioria das vezes não representam nada, frente aos suspeitos critérios de indicação e escolha. Uma Casa Legislativa no Estado faz tanto isso, que quando um dia tiver investigados seus desmandos de forma séria, o nome da Operação poderia ser até ‘Confete’, já que de público passa uma imagem e nos bastidores põe em prática os mais ardilosos planos não republicanos. Inclusive procurando silenciar instituições e jornalistas que tentam denunciá-la.
ESCUTA E DIÁLOGOSMoreti foi flagrado de forma comprometedora, através de escuta, como já revelou o
Blog Bastidores –
Ver Diálogo. O que se revela agora são os inúmeros e incontáveis relatos que remetem a uma funcionária do defensor público a responsabilidade pela arrecadação da propina. O nome da servidora é Katiane Medeiros Falcão, a quem é atribuída o recolhimento do ‘dízimo’.
Na escuta telefônica, Moreti incentivaria - até porque não poderia ser ele a pessoa que arrecadava os valores daqueles a quem deveria prestar serviços gratuitos - a cobrança da propina. Os relatos dos supostos lesados logo abaixo, quando posto em prática os supostos conselhos de Moreti, causam profunda indignação.
Chega a indignar também a forma como se portou Moreti em alguns momentos, em que ao não entregar o que prometera sua funcionária, tentava mostrar desconhecimento de que ela havia sim cobrado algum valor, e por fim, anunciava que as quantias iriam ser devolvidas. Um verdadeiro balcão de negócios dentro da Defensoria Pública do Estado.
SENHORA POBRE É COBRADA DEBAIXO DE UM PÉ DE CAJU: “R$ 5.000,00”
Um das senhoras vítimas, Francisca da Paz Sousa, tentando obter prestação de serviço jurisdicional para soltar o filho com a ‘ajuda’ do defensor, “saiu com Katiane até um pé de caju onde parou (a depoente pensou inclusive que estavam indo para o Fórum) e perguntou sobre a condição financeira da depoente tendo esta dito que não tinha condição, ocasião em que Katiane disse que o preço era R$ 5 mil”. Isso é que é tentar subjugar uma mãe em desespero.
“O PREÇO É R$ 2.500,00”
Outro achacado pela funcionária de Moreti foi o senhor Antônio Fortes Freire, que afirmou que “é verdade que entregou em agosto de 2014 na casa da Sra Katiane a quantia de R$ 2.500,00 (dois mil e quinhentos reais em espécie), para que providenciasse o atestado de óbito”. Isso é que é desrespeitar os humildes.
“O PREÇO É R$ 3.000,00”
Mais uma a ser afrontada em seus direitos foi Luciana Silva Sousa. Ela relatou “que Katiane quando voltou já foi dizendo que existia uma maneira mais fácil do irmão da depoente sair, que tinha uns contatos em Teresina, mas não falava nomes; que falou que com R$ 3.000,00 tirava ele e que o irmão não chegaria nem a descer para a Casa de Custódia”.
MORETI SABERIA DAS COBRANÇAS
Narra a senhora Angela Marques de Oliveira Nunes que “uns 15 dias depois a testemunha [ela própria] voltou à Defensoria e falou para o Dr. Adriano que pagou R$ 5.000,00 para Katiane e este informou que já havia ligado para ela devolver o dinheiro”.
Um nova testemunha que consta dos autos é o senhor Raimundo Rocha de Sousa. Em seu depoimento ele conta “que não se recorda quantas vezes falou com o Dr. Adriano, sabe que foram várias vezes, sempre na sala do Dr. Adriano, e sempre ele dizia que estava resolvendo o caso”.
Ainda “que deu conhecimento para o Dr. Adriano que pagou o dinheiro para Tatiane, o Dr. Adriano dizia que iriam pagar [devolver] o dinheiro, que Dr. Adriano sabia que a testemunha tinha dado dinheiro para Tatiane pelos serviços porque a própria testemunha lhe disse”.
DEFENSOR FICA NERVOSO QUANDO LHE FOI COBRADO R$ 7.500,00
O que seria um outro Raimundo, dessa vez Rodrigues de Sousa, narra que “quando pediu para devolver o dinheiro estava só o Defensor Adriano, não estava Katiane, que Dr. Adriano ficou nervoso, levantou da cadeira e falou ‘Sr. Raimundo, pelo amor de Deus, não me conte isso não, está acontecendo isso?; a testemunha respondeu: ‘está sim, senhor. A Katiane me pediu esse dinheiro, R$ 7.500,00'”.
A testemunha aqui já citada, Luciana Silva Sousa, acrescentou ainda “que o pai da depoente comentou com esta que falou para o Dr. Adriano que já que não resolveram o problema do filho que queria o dinheiro de volta, ocasião em que o Dr. Adriano afirmou que não era para ter sido pago dinheiro; que Dr. Adriano perguntou que dinheiro era esse, aí o pai da testemunha contou a história e que Dr. Adriano ficou nervoso”.
MAS RELATOS DE QUE MORETI SABERIA DAS COBRANÇAS
No rol de testemunhas cosnta ainda Katia Mesquita da Ponte. Ela afirmou “que quando da conversa com o Dr. Adriano a testemunha e sua tia falaram sobre o dinheiro e Dr. Adriano nem deu importância, que o tio veio várias vezes na Defensoria falar com o Dr. Adriano e ele também não dava atenção (...); que tem certeza que Dr. Adriano sabia que Katiane estava cobrando dinheiro da testemunha e dos tios”.
MORETI NUNCA LEVOU O CASO AO CONHECIMENTO DOS SEUS SUPERIORES
Adriano Moreti, que era tido como um respeitado defensor público, nunca comunicou o recebimento de propina por parte de sua funcionária aos seus superiores, como manda a lei, mesmo diante de tantos relatos, pedidos de devolução e avisos.
Isso tudo só aumenta as suspeitas de que ele seria um dos beneficiados da dinheirama. O que é algo vergonhoso para a história da Defensoria Pública do Piauí: só realizar um serviço gratuito mediante pagamento advindo de pessoas pobres, sendo que sua função primeira é defender os sem recursos.
ELE NÃO SABIA
Mas para o Palácio de Karnak, Moreti só cometeu conduta omissiva “reiterada” ao não avisar ao seu superior das práticas nada republicanas de sua funcionária.
O seja, o governador Wellington Dias (PT) o absolveu do crime contra a Administração Pública, do crime de Improbidade Administrativa e do crime de Corrupção, que acarretariam em demissão sumária.
Conta como defensor de Moreti nos autos, o presidente da Associação dos Defensores Públicos, João Batista Viana do Lago Neto, para quem Moreti, “ao contrário do que se falou, o que se sabia era um defensor atuante, conduta exemplar, membro mais votado do Conselho e pelas comarcas que passou sempre fez um trabalho notável”.
Como se vê, defensor público, defensor público - proprineiro ou não; os pobres e a opinião pública à parte.
MORETI NÃO APARECEU PARA SE DEFENDER
Quando da realização do Processo Administrativo Disciplinar pela Defensoria Pública, que acabou por pedir a demissão de Adriano Moreti por questões “gravíssimas”, e mesmo assim não foi aceito pelo governador do estado, o agente público não compareceu às audiências para se defender.
Na primeira vez apresentou um atestado médico. Na segunda, seu advogado pediu que adiasse. E na terceira e última vez, faltou sem apresentar justificativas.
Um homem íntegro, abatido por denúncias caluniosas, é capaz de se indignar e ir à luta. No âmbito administrativo, Moreti não lutou. Nem perante a opinião pública, pelo menos até agora.
Na justiça já houve a anulação de provas pelo trabalho mal feito da polícia e da juíza, que não se declarou incompetente para atuar no caso e acabou por autorizar a escuta telefônica contra Moreti, além de quebrar seu sigilo bancário.
Como Moreti só pode ser julgado pelo Tribunal de Justiça, por ser um defensor público, e com orgulho, as provas foram declaradas nulas.
Como vem se dizendo, no Piauí não há preparo para se investigar a corrupção.