sexta-feira, 29 de novembro de 2024

Áudio revela esquema de venda de CNH no Detran-PI: “‘Se você estancar, eles não vão poder fazer muita coisa”

Operação contra venda de CNH em Teresina e José de Freitas resultou na prisão de 17 pessoas, incluindo servidores e instrutores de autoescolas


Áudios obtidos pela Polícia Civil do Piauí revelam como servidores do Departamento Estadual de Trânsito (Detran-PI) e funcionários de autoescolas facilitavam fraudes nos exames práticos para obtenção da Carteira Nacional de Habilitação (CNH). Conforme a investigação, alunos chegavam a pagar até R$ 600 para obter a CNH. A operação, intitulada Cribelo, resultou na prisão de 17 pessoas, incluindo servidores do Detran e instrutores de autoescolas, além de apreensões de veículos e bloqueios de bens.

Em esquema, alunos chegavam a pagar até R$ 600 para obter a CNH.  - (Arquivo / O Dia)Arquivo / O Dia
Em esquema, alunos chegavam a pagar até R$ 600 para obter a CNH.

Em um dos áudios, uma instrutora de autoescola orienta um aluno sobre como agir durante a prova. Ela detalha que o aluno não deve estancar o carro, já que a ação seria facilmente registrada pelo sistema de monitoramento do Detran, que agora possui câmeras e dispositivos de georreferenciamento nos veículos. A instrutora ainda explica que os examinadores não podem falar abertamente durante o teste devido ao sistema de câmeras e microfones no carro, mas dão orientações discretas para os alunos, como pedir para “dobrar à direita” ou “acionar a seta”, sempre em voz baixa.

“Amanhã, o examinador não vai poder falar nada contra sobre o assunto. Eu vou passar o dinheiro para eles e eles vão facilitar, mas aí tu vai ter que fazer tudo bonitinho. Procure não estancar o carro. Aí ele vai ficar falando: ‘Dá seta, dobra à direita’, só que ele vai ficar falando baixo, ele não pode falar alto porque o carro é cheio de câmera. Se você estancar, eles não vão poder fazer muita coisa por ti [...] Tu tem que ficar ligada para fazer direitinho. 

Operação interditou autoescola em Teresina - (Divulgação / Polícia Civil - PI)Divulgação / Polícia Civil - PI
Operação interditou autoescola em Teresina

Outro trecho dos áudios revela como a instrutora orienta o aluno a se manter calado durante o exame para evitar complicações. "Não pode falar nada, senão vai dar processo, então caladinha".

No áudio, a instrutora também menciona que, caso o aluno não passe no teste, o valor pago será devolvido. No entanto, se ele for aprovado apenas na baliza, metade do valor será reembolsado. “Caso você não passe, que Deus me livre, tu vai passar. Caso você não passe, eles vão devolver o dinheiro e eu te devolvo o dinheiro. Caso você passe na baliza e fique no percurso, aí eles ficam com a metade e te devolvem a outra metade do dinheiro”.

Operação foi resultado de novo sistema de monitoramento no Detran-PI

A operação foi desencadeada após a implementação de um novo sistema de monitoramento no Detran-PI, que permite o acompanhamento em tempo real dos exames práticos. De acordo com a diretora-geral do Detran, Luana Barradas, os veículos utilizados para as provas possuem câmeras, microfones e tablets conectados ao sistema, que registra todas as ações durante o exame. A análise das imagens permitiu detectar comportamentos irregulares, resultando na denúncia e, posteriormente, na ação policial.

A investigação foi alimentada por denúncias anônimas e apoiada em gravações que mostram claramente a troca de favores entre os despachantes, instrutores e examinadores. 

Operação foi resultado de novo sistema de monitoramento no Detran-PI - (Assis Fernandes/O Dia)Assis Fernandes/O Dia
Operação foi resultado de novo sistema de monitoramento no Detran-PI

Além da prisão de servidores do Detran e de instrutores, a operação também revelou uma discrepância entre os rendimentos dos investigados e seus bens patrimoniais, o que indica uma possível prática de lavagem de dinheiro. A polícia também está apurando a situação dos alunos que foram beneficiados pelo esquema e promete reanalisar os vídeos dos exames em que há suspeita de fraude. 

Os acusados, entre eles servidores públicos e despachantes, respondem pelos crimes de corrupção passiva, corrupção ativa e associação criminosa. A investigação continua, e as autoridades incentivam que outras pessoas envolvidas ou que tenham testemunhado a venda de CNHs denunciem o esquema.


fonte portalodia.com