Viagem de puro encantamento, o Parque Nacional da Serra da Capivara, no sudeste do Piauí, é um apaixonante passaporte aos costumes e às crenças dos primeiros habitantes das Américas. Criado em 1979, o parque possui mais de 700 sítios arqueológicos com pinturas rupestres de até 12 mil anos, dos quais 170 são abertos à visitação pública.
Esculpidas em gigantescos paredões rochosos, as pinturas retratam fatos da vida pré-histórica, revelando como viveram os primeiros homens no continente americano. São cenas de lutas, caças, animais, sexo, partos, crianças e muitas outras.
Percorrer esse mítico solo é como estar em um museu a céu aberto, desvendando gradativamente um pouco mais sobre a nossa própria história. Significa também conhecer a única unidade de conservação do País destinada à preservação da caatinga, palavra indígena que significa floresta branca.
Por toda a sua importância, o parque de 214 quilômetros de perímetro foi declarado Patrimônio Cultural da Humanidade pela Unesco. A porta de acesso a essa valiosa e ainda pouco conhecida joia brasileira é São Raimundo Nonato, no Piauí. Infelizmente, ainda não é muito fácil chegar até lá – o aeroporto local está sendo construído e pode começar a operar ainda neste ano.
Enquanto isso não acontece, a saída é embarcar num voo rumo a Teresina. São Raimundo Nonato fica a 530 quilômetros da capital do Piauí, de onde é possível pegar um ônibus, alugar um carro ou contratar um pacote para a Serra da Capivara.
Outra opção é voar para Petrolina, em Pernambuco, e de lá colocar os pés na estrada. Aproximadamente 300 quilômetros separam as duas cidades. O maior obstáculo neste trajeto aparentemente simples é a rodovia, em alguns trechos totalmente abandonada e inexistente. Em outros, invadida por bois, bodes, cabras... É preciso dirigir com extremo cuidado!
Mesmo assim, a aventura compensa. Ela conduz a uma experiência única e extremamente privilegiada. Afinal, não é todo dia que se a chance de estar diante daqueles monumentais paredões repletos de desenhos pré-históricos, testemunhando a imensidão de “templos” erguidos pelo deus tempo ao longo de milhares de anos.
Os caçadores-coletores – Principal cartão-postal de São Raimundo Nonato, o parque – apesar disso – não é a sua única atração. A pequena cidade de pouco mais de 35 mil habitantes abriga a Fundação Museu do Homem Americano (Fundham). Inaugurado em 1986, é presidido pela arqueóloga Niéde Guidon.
No interior do moderno espaço encontram-se milhares de valiosos achados arqueológicos e paleontológicos da pré-história americana. São esqueletos de pessoas, fósseis de animais da megafauna e de plantas, artefatos de pedra lascada e utensílios domésticos, só para citar algumas das descobertas feitas nas últimas quatro décadas por cientistas que “exploram“ a região.
Graças ao trabalho dos pesquisadores brasileiros e do Exterior, hoje, sabe-se, por exemplo, que os antigos povos que habitaram aquelas terras eram caçadores-coletores. Sua sobrevivência era assegurada pela caça e pela coleta de produtos animais e vegetais, como mel, ovos, frutos, raízes e tubérculos.
Mas ainda há muito mais a se desvendar. Até agora esse fascinante tesouro nacional não foi totalmente descoberto. A cada ano, novas pesquisas, que desde 1982 são ininterruptas, possibilitam a descoberta de novos sítios e de novas espécies de animais, de plantas e de monumentos geológicos.
Retratos do Piauí – Quem ainda não conhece a Serra da Capivara pode ter uma ideia de sua preciosidade ao ler o livro “A Natureza do Piauí”, com texto do premiado jornalista Sérgio Adeodato e fotos de André Pessoa, um dos melhores fotógrafos de natureza do País.
A publicação traz um novo olhar para um Piauí, expondo, por meio das imagens fotográficas, o acervo natural e cultural de um Estado que se diferencia pelo encontro de variadas paisagens, típicas dos biomas Caatinga, Cerrado e Mata Atlântica, além de sua zona costeira, de seus ambientes marinhos e de sua diversidade biológica única, com espécies da flora e da fauna ainda desconhecidas.
Entre os destaques, está o Parque Nacional Serra da Capivara, uma das maiores concentrações de pinturas rupestres do mundo. Mantido e estruturado para visitação a partir do trabalho de conservação e pesquisas da arqueóloga Niéde Guidon, os sítios arqueológicos se juntam à beleza da Caatinga ali protegida.
A edição também discorre sobre o Cerrado, revelando que o desafio está na conservação de suas águas, especialmente das fontes que nutrem o Rio Parnaíba, um dos principais do Nordeste. As imagens “falam” alto no esforço por uma maior conscientização para manter o manancial livre da desertificação, conservando a vida silvestre e a beleza cênica do seu encontro com o oceano.
Outro destaque do livro é o Delta do Parnaíba, único em mar aberto das Américas e um refúgio de manguezais, dunas e praias. Há, ainda, uma homenagem aos mateiros, personagens que dominam o conhecimento sobre a natureza e são indispensáveis às pesquisas científicas e aos esforços de conservação.