domingo, 30 de novembro de 2014

Moradores de bairros marcados pela violência cobram políticas públicas


Moradores de bairros marcados pela violência cobram políticas públicas

Famílias que tiveram seus filhos mortos reclamam da falta de opções de lazer e trabalho para ocupar o tempo livre dos jovens teresinenses

Um levantamento da Secretaria de Segurança Pública do Piauí aponta que o bairro Promorar, zona Sul de Teresina, registrou, em 2013, o maior número de mortes na capital. A maioria das vítimas é jovem. Entre os motivos dos crimes está a disputa pelo comando do tráfico, sobretudo nas regiões periféricas. Adriana Conceição Gomes enterrou o filho Richardson há nove meses, morto por engano. A polícia identificou e prendeu o acusado, que foi solto seis meses depois. A sensação de impunidade e o medo silenciam várias comunidades que são obrigadas a conviver com ações violentas.
O jovem que não tem a vida interrompida tem poucas opções para seguir um caminho diferente. Nessas regiões onde a violência comanda a rotina dos moradores, faltam quadras de esportes, oferta de cursos profissionalizantes, oficinas de arte e outras atividades de lazer e trabalho que envolvam a juventude. De acordo com a Secretaria de Segurança Pública, de todas as mortes ocorridas no ano passado, 80% tiveram os jovens como vítimas.
No bairro Promorar, uma das regiões mais violentas da capital, o que se observa são casas e comércios com gradeados. Crianças e adolescentes só circulam pelas ruas do bairro acompanhadas por adultos. Pedir uma informação no bairro é um desafio. O medo acompanha a maioria dos moradores, que recordam como o bairro já foi um local mais tranquilo para morar.
A dona de casa Antônia Gomes confirma a sensação de insegurança. “Nós estamos presos dentro de nossas casas. Não se fica sequer na calçada de casa, com medo de assaltos ou até de assassinatos como já aconteceu com minha família. Os jovens do bairro também estão presos em suas casas, impedidos de transitar, porque os pais estão apavorados com a violência que tomou conta do bairro”, reclama.
Antônia Gomes teve o neto assassinado há nove meses e lamenta que a juventude, de uma maneira geral, esteja se envolvendo em crimes. “É preciso oferecer condições para esses jovens se afastarem dessa realidade, principalmente as crianças e adolescentes que estão trancadas em casa por medo. Porque esses jovens que já se perderam na violência, na minha opinião, não há como recuperar”, pontua.
A avó e mãe de 13 filhos teme pela segurança de sua família. “Meu filho mais novo não se sente seguro no bairro. Já chegou a pedir para nos mudarmos a cada novo assassinato. Tenho quatro filhas que estudam e trabalham e, cada vez que elas saem de casa, não sei se vou vê-las novamente”, lamenta. No frigorífico da família, que fica em uma das avenidas mais movimentadas da cidade, a reclamação é unânime: falta segurança, mas falta também mais cuidado com a juventude de Teresina.
Vítimas têm até 29 anos e são homens negros
O Mapa da Violência 2014 apontou que 100 a cada 100 mil jovens com idade entre 19 e 26 anos morreram de forma violenta no Brasil em 2012. O mapa considera como morte violenta a resultante de homicídios, suicídios ou acidentes de transporte. O estudo mostra que, nos anos 1980, a taxa de mortalidade juvenil de 146 por 100 mil jovens, e passou para 149, na mesma proporção, em 2012.
O Sistema de Informações de Mortalidade (SIM), do Ministério da Saúde, apontou que do total de 77.805 óbitos juvenis registrados, 55.291 tiveram sua origem nas causas externas - mais de 71% do total. Os homicídios e acidentes de transporte foram os doisprincipais responsáveis por essas mortes em 2012. Os dados do Mapa da Violência 2014 mostraram um crescimento de 13,4% de registros desse tipo de morte em comparação ao número obtido em 2002.
O percentual é um pouco maior que o de crescimento da população total do país: 11,1%. O estudo é feito pelo Centro Brasileiro de Estudos Latino-Americanos (Cebela), que se baseia no Sistema de Informações de Mortalidade (SIM) e em outros dados do Ministério da Saúde para fazer o levantamento.
Perfil
As principais vítimas são jovens do sexo masculino e negros. Ao todo, foram vítimas desse tipo de morte 30.072 jovens, com idade entre 15 e 29 anos. O número representa 53,4% do total de homicídios do país. Também, desse total, 91,6% eram homens. Os dados de 2012, último ano da série projetada pelo mapa, mostram ainda que, a partir dos 13 anos de idade, o percentual começa a crescer. Passa de quatro homicídios a cada 100 mil habitantes para 75 quando se chega aos 21 anos de idade.
Ao todo, ao longo dessa década, morreram 556 mil pessoas vítimas de homicídio. A situação foi amenizada através da criação de políticas de enfrentamento à violência desenvolvidas no país como, por exemplo, a Campanha do Desarmamento e o Plano Nacional de Segurança Pública.
De acordo com o Mapa da Violência, entre 2002 e 2012, houve crescimento dos homicídios em 20 das 27 unidades da Federação. Sete delas registraram crescimento explosivo: Maranhão, Ceará, Paraíba, Pará, Amazonas, Rio Grande do Norte e Bahia, onde as taxas de mortalidade juvenil, devido a homicídios, mais que triplicaram.
Mãe de jovem morto teme pelos filhos
Adriana Conceição Gomes é mãe de três filhos. Um deles, Richardson, na época com 17 anos, foi assassinado por engano na porta de casa. Era início de noite e Richardson estava na esquina de casa com o avô quando um homem em uma moto se aproximou e atirou contra o adolescente. A polícia investigou e prendeu o acusado, mas ele foi solto seis meses depois.
Adriana e o marido Raimundo Nonato Gomes convivem, hoje, sem a presença do filho e temendo pelo futuro dois outros filhos adolescentes. “Meus filhos sempre foram orientados para o bem. Convivem em família, com os primos que são muito unidos. Essa tragédia abalou a nossa família. Hoje, temo pela segurança dos meus filhos”, contou.
A mãe de Richardson lamenta morar numa região que foi tomada pela violência e acrescenta que os jovens que moram no bairro e regiões vizinhas têm poucas opções de lazer. “Aqui, as crianças e adolescente ocupam o tempo indo para a escola; nem mesmo brincar na rua como era de costume, os pais não permitem mais. Falta mais policiamento. No início do ano tivemos um reforço, mas a violência voltou anos assombrar. Depois que a vida do meu filho foi tirada, mais mortes por motivos banais aconteceram”, lamenta Adriana.

fonte portal o dia