Primeira dose de vacina anti-HIV é aplicada em macacos no Butantan
O Instituto Butantan e a Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP) aplicaram na terça-feira (5) a primeira dose de uma vacina brasileira anti-HIV em quatro macacos rhesus adultos (entre 2 e 7 anos) e saudáveis que vivem no macacário do Butantan. O objetivo do estudo é encontrar um método seguro e eficaz de imunização contra a Aids para ser usado em seres humanos.
Segundo o professor da FMUSP e pesquisador do Instituto do Coração (Incor) Edecio Cunha Neto, um dos coordenadores do trabalho, serão aplicadas quatro doses nessa primeira fase de testes. Três delas, que serão injetadas a cada 15 dias, contêm a mesma substância (fragmentos de HIV), e a quarta tem como vetor (hospedeiro intermediário) um vírus que causa resfriado, chamado adenovírus 5. Essa última dose será aplicada dois meses após a terceira, o que deve ocorrer em fevereiro. Ao todo, os quatro macacos serão acompanhados por seis meses.
"A combinação do HIV com o vírus do resfriado causa uma resposta imune mais poderosa. Devemos ter os primeiros resultados já em abril. Se essa etapa der certo, a vacina será aplicada em outros 28 macacos do Butantan", diz Cunha Neto.
Segunda fase em 2014
Na segunda fase de experimentos, prevista para o primeiro semestre de 2014, os 28 macacos serão divididos em quatro grupos e receberão duas ou três doses da vacina, com diferentes combinações de três vetores virais (adenovírus 68, que causa resfriados em chimpanzés; vírus da vacina da febre amarela e um derivado da vacina da varíola).
"Os animais não vão se infectar com essas doenças nem com o HIV, pois a vacina inclui apenas pequenos pedaços do vírus e ele não infecta macacos, apenas o SIV (Vírus da Imunodeficiência Símia), 'primo' dele", explica o pesquisador. Segundo Cunha Neto, o SIV passou para os humanos na segunda metade do século 19, não por meio de relações sexuais, como muitos imaginam, mas por caçadores que matavam os macacos e se feriam nas mãos com os ossos na hora de cortar os pedaços da carne. Cunha Neto diz que isso foi deduzido por sequenciamento genético dos dois vírus.
A equipe acredita que esses fragmentos de HIV já sejam suficientes para o hospedeiro (no caso, o macaco) combater a infecção. Ao todo, os 28 macacos serão acompanhados durante dois anos. Em um ano após a aplicação da primeira dose, já será possível saber exatamente a resposta imune da vacina, ressalta Cunha Neto. Mas o acompanhamento se estenderá por mais 12 meses para verificar por quanto tempo essa imunidade se mantém, se é realmente duradoura.
De acordo com o diretor do Butantan, Jorge Kalil, um dos responsáveis pela pesquisa, toda essa fase pré-clínica, em animais, deve se estender até 2016.
"Com a primeira dose que aplicamos ontem, esperamos que os macacos produzam anticorpos chamados linfócitos T auxiliadores (CD4), que serão capazes de se proliferar e favorecer a resposta de defesa", diz Kalil, que iniciou o projeto em 2001. O imunizante contido na vacina, batizado de HIVBr18, foi desenvolvido e patenteado pela USP.
As próximas doses, segundo o diretor do Butantan, funcionarão como um reforço para aumentar o nível da resposta imune dos macacos. Paralelamente à aplicação da vacina anti-HIV, os pesquisadores vão estudar, in vitro, o plasma sanguíneo e as células dos animais para avaliar o grau de resposta e se a dose pode ser realmente efetiva. Essas amostras de sangue também serão expostas em laboratório a fragmentos de HIV.
Segundo Cunha Neto, a partir do momento em que saírem os primeiros resultados no grupo dos 28 macacos, os cientistas pretendem dar entrada, junto à Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e à Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (Conep) – ligado ao Ministério da Saúde –, nos protocolos para início dos ensaios clínicos em humanos.
"Assim, podemos ganhar tempo, pois essa etapa de aprovação costuma demorar um ano. Por isso queremos antecipar esse processo em alguns meses", diz o pesquisador da USP.
Macacário mais seguro
Para evitar investidas de ativistas contra o uso de animais em pesquisas, o macacário do Instituto Butantan teve a segurança reforçada antes do início dos testes com a vacina anti-HIV. O local ganhou câmeras de monitoramento 24 horas e vigias em mais turnos.
Segundo Cunha Neto, os animais são bem tratados e, ao contrário do que dizem os ativistas, não é possível substituir os macacos por outra coisa para saber se a vacina funciona.
"Para saber se ela causa algum malefício no indivíduo, precisamos testar a dose em um organismo inteiro. É muito radical achar que os próprios humanos deveriam ser cobaias. Se a vida desses ativistas um dia estiver em risco e eles precisarem de remédio para hipertensão ou doença cardíaca, duvido que se lembrem disso", afirma o pesquisador.
fonte g1