A violência é uma experiência sentida diretamente por um de cada cinco brasileiros que vivem nas cidades com mais de 15 mil habitantes. São vítimas de sequestro, fraudes, acidentes de trânsito, agressões, ofensas sexuais, discriminação e furto e roubo de automóveis, motocicletas e outros objetos. Os dados são da Pesquisa Nacional de Vitimização e cobre o período de 12 meses anterior à realização do levantamento, realizado em dois períodos entre junho de 2010 a outubro de 2012.
A pesquisa foi feita pela Secretaria Nacional de Segurança Pública (Senasp) do Ministério da Justiça, em conjunto com o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud), o Centro de Estudos de Criminalidade e Segurança Pública da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e o Datafolha.
Segundo a pesquisa, 21% dos brasileiros afirmaram que foram vítimas de, pelo menos, um dos crimes ou ofensas cobertos pelo levantamento nos 12 meses anteriores à coleta dos dados. Quando questionados se já tinham sido vítimas ao longo de toda a vida, o número sobe para 32,6%.
Em geral, a taxa de vitimização é maior no Norte e Nordeste, nas capitais e entre os mais escolarizados, ricos e jovens. Em geral, os crimes e ofensas ocorrem dentro ou perto de casa, sem o uso de arma de fogo. A maioria das vítimas não sofre ferimentos nem precisa de atendimento médico.
Quem é vítima, em geral, não faz queixa: 80,1% não comunicaram à polícia sobre o ocorrido. Por outro lado, 54,6% dos que foram até a polícia se disseram satisfeitos com atuação da corporação. Essa satisfação, porém, se deve mais à cordialidade e à atenção dos policiais do que ao desempenho deles em recuperar o bem perdido ou localizar o agressor. Entre os que se dizem insatisfeitos com a polícia, as razões subjetivas - como a falta de atenção dos policiais - também predominam. Em geral, os mais velhos aprovam mais a polícia do que os mais jovens.
A maioria (77,6%) também afirmou confiar na polícia militar, mas revelou ter várias impressões negativas sobre a corporação. Contou com a concordância de boa parte dos entrevistados frases como "os policiais militares fazem “vista grossa” à desonestidade de seus colegas”, “os policiais militares abusam do uso da força e de sua autoridade”, e “os policiais militares são preconceituosos quando abordam as pessoas na rua”.
Brasileiros sentem que criminalidade aumentou
A pesquisa mostra ainda que a maioria dos brasileiros (60,3%) sente que a criminalidade piorou nos últimos 12 meses. Essa sensação é maior em relação à cidade onde moram do que em relação à sua vizinhança. A pesquisa também confirma que o brasileiro se sente mais seguro ao andar pelas ruas da cidade durante o dia do que à noite. A capital em que os moradores se sentem mais seguros é Florianópolis. A sensação de insegurança é maior nas ruas de Belém, Maceió, Fortaleza, São Paulo e São Luís.
Segundo a pesquisa, 64,9% temem morrer assassinados, índice que sobre para 86,8% em Teresina, 80,7% em Belém e 80,6% em João Pessoa. Os crimes que provocam mais medo são ter a residência invadida ou roubada (71,9% têm medo) e ter objetos pessoais de valor tomados à força por outras pessoas em um roubo ou assalto (70,7%).
A Polícia Civil merece a confiança de 79,1% da população, mas a avaliação do seu trabalho é menos positiva: a investigação de crimes é aprovada por 38,2%. Para 33,6%, esse trabalho é apenas regular, e 14,7% o consideram ruim ou péssimo. A pesquisa também mostrou dificuldade da polícia em identificar os autores dos crimes e ofensas quando eles não são conhecidos das vítimas.
Estados do Norte e Nordeste têm mais vítimas
Os estados onde mais pessoas se disseram vítimas de algum crime ou ofensa nos 12 meses anteriores foram: Amapá (46%), Pará (35,5%), Rio Grande do Norte (31,3%), Acre (29,9%), Ceará (26,6%), Amazonas (25,2%), Roraima (24,8%), Mato Grosso (23%) e Tocantins (23%). Na outra ponta estão os estados do Sul - Santa Catarina (17%), Rio Grande do Sul (17,2%) e Paraná (17,4%) - seguidos por Rondônia (18,1%), Minas Gerais (19,1%) e Sergipe (19,4%).
O Rio está um pouco abaixo da média nacional, com 20% dos fluminenses entrevistados dizendo que foram vítimas de crime ou ofensa nos 12 meses anteriores. Mas, quando se trata de crimes ao longo de toda a vida, a taxa chega a 35,1%, acima da média brasileira.
Entre as capitais, Macapá tem a maior taxa de vitimização (47,1%), seguida por Belém (41,1%), Rio Branco (31,9%), Fortaleza (31,5%), Natal (31%) e São Luís (28,6%). Apenas três capitais têm taxas menores que a média nacional: Brasília (20,3%), Aracaju (19,8%) e Palmas (19%). O Rio tem a quarta menor taxa (21%), igual à média brasileira.
Enquanto a maioria dos brasileiros acredita que a criminalidade aumentou em sua cidade ao longo dos 12 meses anteriores, o município do Rio se destaca pelo contrário. É a capital onde mais pessoas acreditam que a criminalidade diminuiu tanto na cidade (28,4%) quanto na vizinhança (33%).
O Rio também é, entre as vítimas que fizeram queixa formal, a capital que mais aprova a atuação da polícia: 69,4%, à frente de Natal (65,6%), Recife (62,4%), Belo Horizonte (62,3%) e Salvador (61,4%). As taxas mais baixas de aprovação são observada em Maceió (38,6%), Porto velho (40,4%) e Teresina (40,4%).
As agressões e ameças são os crimes mais comuns: 14,3% dizem já ter sofrido com o problema. Em seguida vêm discriminação (10,7%), furtos de objetos (9,8%) e fraudes (9,2%). Segundo a pesquisa, os agressores, em geral, são pessoas conhecidas, mesmo que não muito próximas da vítima.
Na maioria dos casos - 72,5% - não há uso de armas. A situação se inverte quando se trata de roubo de carros e motos e de sequestro. A maioria dos casos terminou sem provocar ferimentos nas vítimas. A exceção se dá nos acidentes de trânsito, em que 52,5% das vítimas afirmaram ter se machucado. Ao todo, 39,9% dos acidentados no trânsito precisaram de atendimento médico.
Subnotificação é alta
A notificação está acima da média no Centro-Oeste e Norte, destacando-se o Distrito Federal (33,3%), Roraima (31,3%) e Rondônia (31,2%). A região em pior situação é o Nordeste. O Rio de Janeiro tem a quarta menor notificação do país, empatado com Pernambuco: 14,6%. Estão à frente apenas da Paraíba (11%), Bahia (13,7%) e Rio Grande do Norte (14,2%). Entre as capitais, a que tem maior notificação é Porto Velho (35,4%). Os mais ricos e escolarizados são os que mais denunciam, mas a subnotificação entre eles também é alta, próxima à média nacional.
Os crimes para os quais há mais notificação são os roubos de carro e moto. Na outra ponta, estão as vítimas de discriminação (2,1% de notificação), ofensa sexual (7,5%), fraudes (11,6%), agressões (17,2%) e furtos de objetos (22,6%). "O motivo mais freqüente para o registro da ocorrência é a esperança de recuperar o bem perdido, especialmente nos casos de roubo e furto de motos e de automóveis", diz trecho da pesquisa. Também contribuem para isso a vontade de ver o criminoso preso e o desejo de evitar que o crime se repita.
A pesquisa mostrou ainda que a maioria (68,1%) percebe a presença de PMs na sua vizinhança ou proximidades. Ao todo, 4% disseram já ter sido vítima de violência física da PM, enquanto 6,7% relataram insultos ou agressões verbais, e 2,6% já pagaram propina a PMs. Em relação aos policiais civis, 1,1% dos entrevistados sofreram violência física, 2,1% já foram vítimas de agressão verbal ou insulto, e 0,8% sofreu extorsão ou teve que pagar propina. O Rio, ao lado do Amazonas, é o segundo estado onde mais se paga propina a policiais civis, atrás apenas do Pará.
Mais da metade tem medo de bala perdida
Os entrevistados também foram questionados sobre quais incidentes temem que ocorram na vizinhança: 52% disseram ter medo de bala perdida, 50,7% de estar no meio de um tiroteio, 43,9% de ser assaltado, 43,5% de ser vítima de agressão física, 34,3% de ser confundido com bandido pela polícia, 33,2% de ser vítima de extorsão pela polícia, 29% de ser vítima de sequestro ou sequestro relâmpago, 28,8% de serem confundidos com bandido por agentes de seguranças particulares, 26,2% de agressão sexual, 25,4% de ter carro ou moto roubados em um assalto, 7,6% de ser vítima de agressão por parte de companheiro ou ex-companheiro.
Entre os entrevistados, 2,7% declararam possuir arma de fogo em casa. Os índices são maiores no Sul (4,4%) e Centro-Oeste (4%), com destaque para o Rio Grande do Sul (6,2%) e Distrito Federal (5,8%). Os principais motivos que levam uma pessoa a ter arma em casa são a tentativa de prevenir ou se proteger de crimes ou o fato de pertencer às forças armadas e policiais.
A pesquisa ouviu 78 mil pessoas com mais de 16 anos em 346 municípios com mais de 15 mil habitantes em dois períodos distintos: entre junho de 2010 e maio de 2011, e de junho a outubro de 2012.
Os responsáveis pela pesquisa comentam os resultados
A secretária Nacional de Segurança Pública, Regina Miki, disse que é baixo o número de serviços colocados à disposição da população, como ouvidorias e corregedorias, nessa área. Ela fez um apelo para que a imprensa divulgue como os Disque 100 - serviço disponibilizado pela Secretaria de Direitos Humanos - e pelo Disque 180, de violência contra a mulher. Apesar de a população responder que confia pouco na Polícia Militar, como demonstrou o resultado, as vítimas ligam maciçamente para o 190, número da PM.
- É um paradoxo. A população não gosta da polícia, mas chama a polícia. O estudo revelou um Brasil muito diverso. Em alguns estados há polícia constituída e outros sem polícia - disse Regina Miki.
A pesquisa foi realizada entre 2011 e 2012 e, portanto, não captou a onda de violência gerada no rastro das manifestações de ruas ocorridas no país.
O professor Cláudio Beato, coordenador do Centro de Estudo de Criminalidade e Segurança Pública da UFMG, também autor do trabalho, ressaltou que essa é a maior pesquisa feita na área de segurança pública no país e destacou o baixo número de pessoas vítimas de algum tipo de violência que fazem notificação oficial do ocorrido. Apenas 20% dessas vítimas deram queixa nos últimos doze meses.
- As vítimas não procuram a polícia. Por algumas razões: ou consideram que foi uma coisa menor, ou porque envolve gente conhecida ou porque não confiam na polícia - disse Beato.
Quando envolve bens materiais de alto valor, as queixas são maiores. A pesquisa demonstrou que 90% dessas notificações envolvem roubo de carro, seguido de roubo de moto (80,7%), furto de moto (70,3%), furto de carro (69,5%) e sequestro (63,5%).
- É ínfimo notificações que envolvam agressões sexuais e discriminação - disse Beato.
O jovem e o morador de periferia compõem a população que não confia na polícia.
fonte meionorte.com