A lei municipal número 4741 do dia 15 de julho de 2015 proíbe integrantes de comunidades terapêuticas de fazerem comercialização de produtos em locais públicos, como transporte coletivo, logradouros públicos, prédios públicos, shopping, bares, restaurantes, entre outros. A fiscalização e punição ficarão a cargo da Prefeitura Municipal de Teresina.
O projeto, de autoria da vereadora Cida Santiago (PHS), foi idealizado junto a Federação Norte e Nordeste das Comunidades Terapêuticas (Fennoct). O presidente da Federação, Célio Luiz Barbosa, conta que as comunidades que iniciaram este tipo de trabalho surgiram há cerca de três anos e ganharam grandes proporções. “Isso não pode ser chamado nem de comunidade terapêutica, está mais para comércio. Comunidade terapêutica não explora pacientes em nome de uma recuperação”, declara.
Segundo Célio Luiz, as comunidades terapêuticas têm normas de funcionamento e diz que a internação deve ser feita de maneira voluntária, sendo mantido em um regime residencial livre de drogas, sexo e violência, além do programa de capacitação e treinamento de seu pessoal, em cursos credenciados pela Secretaria Nacional Antidrogas (SENAD). “Nenhuma comunidade terapêutica dentro das normas aprova essa prática de colocar dependentes químicos na rua, isto representa um grande risco para o tratamento”, explica.
Ainda segundo Célio, quase todas as comunidades terapêuticas do Brasil não contam com ajuda do governo para manutenção, e que buscam alternativas para o mantimento da casa sem que seus internos precisem ir às ruas. “Dentro dessa prática, uma meta é estipulada de aproximadamente 200 quites por dia, se você calcular quanto isso dá por mês, é um número muito grande. Se for para coloca-los para trabalhar, que busquem empregos para que trabalhem para si mesmo e não para a Instituição. Comunidade terapêutica não é comércio”, acentua.
De acordo com Cida Santiago, a fiscalização e punição ficará a cargo da prefeitura. Os líderes dos centros devem repassar a ordem aos pacientes, e caso o comportamento persista, o centro ficará desabilitado a prestar serviço. “O tratamento do dependente químico deve ser interno. O trabalho externo possibilita um contato cotidiano com ambientes propícios para uma recaída no tratamento, colocando-o em risco”, diz a vereadora.
Entramos em contato com uma das instituições que usam este método e fomos informados de que apenas o pastor da central, localizada na capital do Rio de Janeiro, pode dar declarações sobre a instituição. Contudo, fomos informados de como funciona o trabalho realizado por eles. Os residentes são enviados para sedes longe de onde são originados, por exemplo, os residentes de Teresina são dependentes químicos vindos de Belém, São Luis, Fortaleza, entre outras. O tratamento é feito em nove meses.
O tratamento possui duas fases. Na primeira, acontece a desintoxicação. Acontece apenas dentro das dependências da Instituição, onde os residentes realizam atividades de laborterapia, participam de cultos, reuniões, palestras, dinâmicas em grupos e individuais. É realizado com um atendimento personalizado, e sem o uso de medicamentos.
A segunda fase tem como intuito a reintegração social, onde os residentes participam de atividades coletivas e individuais de divulgação dos informativos que são feitos na primeira fase do tratamento, é nesta etapa que os residentes vendem seus quites informativos com pequenos produtos como canetas e chaveiros, para a manutenção da Instituição. Segundo o residente que nos atendeu, esta fase é muito importante, pois além de divulgar todo o trabalho realizado pela Instituição Manassés, leva os residentes a entrarem em contato direto com a sociedade, mostrando que o problema de dependência química tem solução.
A professora Virginia Carvalho usa o transporte público em Teresina e conta que este assunto a deixa dividida. “Fico dividida porque sei que é uma forma de manter a instituição, mas as pessoas que estão nos ônibus também passam por dificuldades, são trabalhadoras e pagam caro pela passagem do transporte coletivo”, declara. Para a professora, deveria haver uma forma de manter a comunidade sem que os pacientes precisem fazer este trabalho.
“O Brasil tem essa questão cultural, de que quando uma pessoa começa a fazer algo, outras começam a imitar. Um dia desses só tinha uma, agora já surgiram outras e hoje somos bombardeados com vários”, diz a professora. Para Virginia, o contato com o dinheiro também representa um risco no tratamento dos dependentes químicos.
Para a vendedora Valquíria Almeida, a presença dos residentes não representa um risco, tampouco incomoda as pessoas. “O problema é que agora tem muitos, está exagerado, e chega a parecer que estão se aproveitando da boa vontade das pessoas”, conta.
Já a vendedora Janaína Pires, esta é uma forma de dar oportunidade para os ex-dependentes químicos de trabalhar. “Não sou contra essas pessoas venderem seus quites nos espaços públicos, até porque de certa forma, isso é um trabalho e é digno e honesto, pelo menos não estão matando nem roubando”, declara.
Para Janaína Pires, a maioria das pessoas que caem no mundo das drogas passaram por problemas muito maiores. “É uma questão social, depois essa pessoa vira um dependente químico, procura ajuda e tem uma comunidade para lhe ajudar. Mas essa mesma comunidade não recebe ajuda do governo, o mesmo que não deu oportunidade para essa pessoa ter uma vida diferente”, declara. Para ela, é errado proibir essa prática e não oferecer ajuda. “Se eles recebessem ajuda, não precisariam ir as ruas. E mais, eles não obrigam ninguém a comprar”, acentua.
Além disso, a vendedora avalia o mercado de trabalho como excludente. “Esses empresários não vão querer dar oportunidade para um ex usuário de drogas, porque as pessoas são julgadas pelo que fizeram e não pelo que vão fazer”, declara. Para ela, esta é uma cadeia de injustiças sociais, e a proibição é mais uma delas.
fonte portal o dia