segunda-feira, 25 de maio de 2015

Máquina inchada e receitas caindo: entenda a crise no governo do Piauí


Máquina inchada e receitas caindo: entenda a crise no governo do Piauí

Governo alega tentativas de mudanças para beneficiar os cofres públicos, mas fontes receita têm despencado


A expressão “cortar na própria carne” virou quase um jargão na administração pública e geralmente é usada em casos de corrupção, significando atitudes radicais tomadas por um governo contra maus gestores. Mas se adaptarmos esse termo a realidade financeira do Piauí, ele poderia representar a coragem do governo de enfrentar a crise financeira do Estado com medidas duras, cortando na própria pele para reduzir gastos e enxugar a hoje inchada máquina pública, que além de cumprir a missão de atender ao interesse público, atende ainda a demandas políticas.
O Piauí enfrenta uma grave crise econômica que tem paralisado a administração do governador Wellington Dias (PT). Diante do histórico financeiro do Estado, uma crise não é nenhuma novidade (muito menos para Wellington que vive a terceira administração). Se a crise não é nova, velhas são as medidas usadas para resolver o problema. De forma superficial, o governo do experiente Wellington Dias diz cortar gastos e aplicar um arrocho fiscal apara resolver o problema.
Wellington Dias / Foto: João Alberto / O Olho
Porém, na prática, o governo do petista mostrou tratar de forma superficial a questão e preferiu mais uma vez não atingir a raiz do problema: a inchada máquina pública. Se ela continua inchada, os gastos se mantêm excessivos e o Estado deve seguir pelos próximos quatro anos se equilibrando na corda bamba do equilíbrio financeiro.
Para especialistas, uma das formas de resolver de maneira mais profunda o problema seria extinguir pastas, cargos, mexer na acomodação de aliados políticos e reduzir números das secretarias hoje existentes. Os excessivos gastos para a manutenção da máquina pública contribuem para esse momento de crise.
Somente no primeiro escalão, são 20 pastas na estrutura do Estado. Em um Estado como o Piauí, em que a economia ainda depende muito da mão do Estado, mexer no tamanho da estrutura não é fácil. Wellington provou isso ao encaminhar à Assembleia Legislativa do Estado uma reforma que não altera em quase nada o tamanho da máquina e mantém quase inalterado os gastos do Estado.
SERVIDOR PENALIZADO
Se faltou iniciativa ao governo para realizar uma mudança profunda e tornar a estrutura administrativa mais leve, sobram penalizações para o servidor público. Os gastos do poder público no Estado são altos e sem uma arrecadação que acompanhe o mesmo ritmo, o governo vive uma crise financeira que tem servido como justificativa para o não pagamento do reajuste salarial aprovado por lei pela Assembleia ainda em 2011 para sete categorias profissionais.
De acordo com o governo, se o reajuste for pago o impacto na folha de pagamento do Estado poderá passar de R$ 27 milhões. Com isso, o Estado ultrapassaria o limite prudencial imposto pela Lei de Responsabilidade Fiscal com o pagamento de pessoal. De acordo com a legislação, o governo não poderia gastar mais de 46,55% das receitas corrente líquidas com a folha de pagamento. Se isso ocorrer, o Estado irá sofrer uma série de sanções como não conseguir a liberação de empréstimos e nem fechar convênios com o Governo Federal.
“REFORMA NÃO EXISTE”
A reforma administrativa encaminhada pelo governo à Assembleia tem recebido críticas da oposição. Para os deputados, Wellington Dias não fez as mudanças necessárias que
Robert Rios / Foto: Thiago Amaral/ O Olho
poderiam ajudar a amenizar a crise econômica. Para o deputado, Robert Rios (PDT), a reforma “não existe”.
“Eu até agora não vi reforma nenhuma. Ela não existe. Reforma é cortar, é fazer transformações profundas. Isso não ocorreu com o projeto encaminhado a essa Casa. O que era Chico agora passa a ser Francisco. Nada mais. Não houve redução de gastos. O Estado precisa disso nesse momento de crise”, disse.
O deputado tucano Marden Meneses afirma que em nada adianta uma reforma que não diminui o peso da máquina pública. Ele afirma que faltou “coragem” ao governo.  “Não chamo de reforma algo que não reduz, não moderniza, não agiliza e não tira o peso da máquina. Para ser reforma tinha que reduzir secretarias e quantitativo de comissionados. Era necessário tornar a máquina mais ágil e diminuir os custos. Se isso ocorresse, teríamos a economia mês para pagar o reajuste salarial, pagar o salário dos servidores efetivos e fazer investimentos”, disse.
MÁQUINA ACOMODA ALIADOS
De acordo com Marden Meneses, a máquina inchada é usada pelo governo para acomodar aliados políticos. “O governo repete as velhas práticas do Piauí de décadas atrás. Os aliados políticos são nomeados para ocupar cargos e manter o apoio. A única saída do Estado será no dia em que se eleger um governo que de fato tenha compromisso público de reduzir essa máquina. Essa enorme quantidade de secretarias que temos (modelo semelhante ao do Governo Federal) apenas garante o emprego e nomeações dos aliados políticos do governo”, avalia.
Deputado critica reforma / Foto: João Brito Jr/O Olho
Para ele, o Estado vive da folha de pagamento do Estado. “Não conseguimos atrair indústrias que geram emprego e renda. Não temos investimento da iniciativa privada. Se dependemos dessa máquina pública, quem quer se manter no poder defende o empreguismo e vai contra a redução da máquina. Quando tivermos governantes com o desejo de se destacar pelo resultado da gestão e não pelo empreguismo de aliados, o Estado dará um passo grande para modernidade”, comenta.
 FONTE DE ARRECADAÇÃO CAI
Ao mesmo tempo em que Estado evita realizar as mudanças necessárias na estrutura administrativa e mantém os mesmos gastos, a principal fonte de receita continua caindo. De acordo com informações do secretário de Governo, Merlong Solano, o Piauí ainda é totalmente dependente do Fundo de Participação dos Estados (FPE).
Secretário afirma que receitas não acompanham gastos Foto: ascom/Alepi
“O FPE é essencial para o Piauí. Do primeiro quadrimestre de 2015 a 2014 ele cresceu 5,9%. Nesse mesmo período a inflação foi de 6,4%. Isso significa que o FPE teve uma queda de 0,5% nos últimos 12 meses. Enquanto isso as despesas não caíram”, destacou.
Nos primeiros quatros meses do ano, o Estado recebeu algo em torno de R$ 1,19 bilhão do FPE. Merlong Solano alerta que neste mesmo período os gastos com pessoal cresceram 12,3% no primeiro quadrimestre deste ano em comparação ao mesmo período de 2014. Esse crescimento ocorre mesmo com o governo afirmando realizar um controle sobre nomeações. Nesse mesmo período, os gastos com pessoal chegaram a 1,38 bilhão. É importante lembrar que a arrecadação do Estado não se resume apenas ao FPE. O Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) também é uma fonte de receitas.
Merlong Solano disse que o Piauí tem um déficit em conta corrente de R$ 200 milhões. Isso significa que o governo poderá fechar o atual exercício financeiro sem ter dinheiro para cobrir o déficit de despesas correntes. Essas despesas são as contas que precisam ser pagas ainda este ano.
De acordo com a equipe econômica do governo, o Estado herdou uma dívida de R$ 500 milhões deixada pela gestão do ex-governador, Zé Filho (PMDB). O culpa a Assembleia Legislativa e as gestões anteriores pela aprovação do reajuste salarial das categorias que ameaçam greve.
“DIA D”
Deixam de receber a última parcela do reajuste salarial os servidores:
Policiais militares
Agentes da Polícia Civil
Professores – UESPI
Peritos Criminais
Servidores do Detran-PI
Agentes Penitenciários
Servidores da Fundação Cepro
Nesta segunda-feira (25/05) será realizada pelos servidores da segurança pública do Estado, uma reunião com o presidente do Tribunal de Justiça do Piauí, desembargador Raimundo Eufrásio Alves Filho. As Polícias Militar e Civil realizarão na terça-feira (26/05) às 9h, assembleias gerais para discutir a situação. A assembleia da Polícia Civil será realizada em frente à Delegacia Geral e a da Polícia Militar será realizada na Praça da Liberdade, próxima ao Karnak.
Para as categorias, amanhã é considerado o “Dia D”. Se o governo não ceder na proposta de pagara a última parcela do reajuste salarial concedido ainda em 2011, haverá greve. Na época da aprovação do reajuste pela Assembleia, ficou acertado que o pagamento ocorreria em quatro vezes. Parcelas foram pagas nos governo de Wilson Martins (PSB) e Zé Filho (PMDB). Já o governo de Wellington afirma que os repasses foram feitos de forma irresponsável e teriam levado o Estado a crise.
Professores protestam para serem convocados em fevereiro deste ano / Foto: Thiago Amaral/ O Olho
A proposta apresentada pela atual gestão prevê o pagamento de 50% do reajuste na folha de pessoal de março. O restante será repassado apenas em janeiro de 2016. As categorias não aceitam e afirmam que estão amparadas pela Justiça e cobram o pagamento integral ainda este mês.
Sobre a continuidade das mobilizações, o Subtenente da Cruz, presidente da Associação dos Bombeiros, informou que há um prazo de recebimento de proposta por parte do Governo é até hoje. “Amanhã a gente vai fazer uma ato solene em frente ao Palácio de Karnak e lá sim a gente vai deliberar com a categoria a respeito dos próximos passos”, disse o subtenente.
Concursados dos bombeiros realizam manifestação no Karnak em março deste ano / (Foto: Wesley Bremes/ O Olho)
 O presidente da Associação Beneficente dos Cabos e Soldados da Polícia Militar (ABECS), Agnaldo Oliveira, afirmou que a categoria se sente desrespeitada com a proposta do governo de parcelar a última parte do reajuste da categoria. "Nenhum profissional iria aceitar que o patrão chegasse e pedisse para pagar apenas uma parte do salário. Os policiais também não aceitam. Hoje um soldado recebe um salário de R$ 2.449 e com o reajuste receberia mais R$ 651. O governo não respeita a categoria", disse.
SECRETÁRIO DEFENDE REFORMA
O secretário de Administração, Franzé Silva, reage ás críticas e afirma que a maior prova de que o governo tem enfrentado a crise de forma dura é a proposta de reforma da Previdência. De acordo com a proposta encaminhada à Assembleia Legislativa do Estado, a previdência deixa de ser liga ao Instituto de Assistência e Previdência do Estado do Piauí (IAPEP) e passa a ser vinculada a Secretaria de Administração.
Franzé afirma que reforma trará melhoras futuras Foto: João Brito Jr/O Olho 
Para Franzé Silva, essa mudança é a prova da coragem do governo de enfrentar a crise. “Não há prova de coragem maior que essa porque com isso o governo caminha para resolver um grande problema. O rombo de R$ 600 milhões com a previdência. Essa decisão vai evitar que no futuro recursos do Tesouro tenham quer ser usados para pagar inativos. Isso contribui e muito para resolver a crise”, disse.
De acordo com o secretário, a reforma possibilita um controle maior dos gastos do Estado. “Mudamos estruturas antigas e isso possibilita um controle de gastos. Desmembramos pastas e isso sem aumentar os gastos. Tudo continua dentro do orçamento já existente. Quando transformamos a Fundação de Cultura em secretaria permitimos que ela esteja mais perto do Ministério da Cultura e com isso consiga mais verbas. Quando se cria a Coordenadoria de Fomento à Irrigação se está promovendo uma transformação no campo e aumentando produção", justificou.
"CRÍTICAS SÃO POLÍTICAS"
Franzé Silva afirma que a oposição usa a reforma para fazer jogo político na Assembleia. “As críticas à reforma são políticas. Poucos governos no Piauí tiveram coragem de fazer uma reforma tão profunda. As mudanças serão sentidas no futuro. O governo se propõe a realizar cortes para que a economia do Estado possa voltar a funcionar”, destacou.
O secretário diz acreditar que um acordo com as categorias será possível. Segundo ele, o governo trabalha para evitar uma greve geral. “Ninguém quer que o Estado volte a ultrapassar o limite de responsabilidade fiscal. Se isso ocorrer, as UTIs serão fechadas mais uma vez, as escolas de tempo integral não funcionaram normalmente. A população não quer que isso ocorra. Apesar das dificuldades o Estado voltou a funcionar porque fazemos as coisas com responsabilidade. Se não fosse assim, estaríamos na mesma situação do final do ano. Um verdadeiro caos”, comentou.  
Segundo o secretário de Governo, Merlong Solano, o Estado precisa se preparar para dias difíceis. “O Governo Federal tem realizado cortes com o arrocho fiscal. Isso significa que essas dificuldades deverão se arrastar até o próximo ano. O governo do Estado de prepara para isso. Caso contrário, os efeitos poderão ser piores que os vivido em 2015”, destacou.

fonte portal o olho